“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

domingo, 28 de outubro de 2012

Biblio de cinema

             É difícil, e por isso rara, a publicação de livros de autores portugueses sobre cinema. Não vem ao caso discutir porquê (o cinema tem má fama entre os editores portugueses ou são os autores que têm má fama?), mas o certo é que são muito poucos, fora da Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema, que tem toda uma política de publicações de grande qualidade, os livros em português e de autores portugueses sobre cinema - mesmo a Cinemateca Portuguesa se socorre, em geral, mais de traduções do que de autores portugueses para as suas edições. Perante este panorama, devo acrescentar que conheço vários livros muito bons nessas condições, portugueses e de autores portugueses sobre cinema, que só tiveram edição on-line.
  
         As Edições Texto & Grafia, de Lisboa, vocacionadas para a edição na área das ciências sociais e humanas, da arte, da filosofia e da ciência, vêm desenvolvendo, desde o seu aparecimento em 2008, um trabalho muito bom e louvável na edição de obras de referência sobre cinema, com a publicação de traduções portuguesas de livros de autores estrangeiros a que de outra maneira os leitores portugueses dificilmente teriam acesso. Na colecção Mi.mé.sis, dedicada primacialmente às artes do espectáculo, esta editora fez sair até hoje doze livros sobre cinema, televisão, a imagem, alguns deles também com edição de bolso, que vêm enriquecer os conhecimentos de qualquer estudioso, estudante ou professor de cinema. Além disso, a mesma editora publicou um "Dicionário teórico e crítico do cinema" (Jacques Aumont e Michel Marie) que é uma obra de referência, muito actual e necessária. Salvo algumas objecções, as traduções são, em geral, muito boas.
            Há críticas que se podem fazer a esta editora a propósito destes livros sobre cinema - sobre o cinema clássico americano havia uma outra obra mais recente e mais desenvolvida, co-coordenada pela mesma autora, só traduziu até agora autores franceses -, mas há que considerar que ainda só editou doze livros nesta colecção, Mi.mé.sis. O facto de ter publicado a edição portuguesa de "Filosofia da Arte", de Noel Carroll, é um bom sinal, que vai no sentido da publicação de autores de língua inglesa, actualmente muito importantes na área do cinema - David Bordwell, Stanley Cavell e o próprio Noel Carroll, por exemplo.
           Muito por causa desta editora, que felicito pela sua actividade na área do cinema mas também noutras áreas das ciências sociais e humanas, da arte, da filosofia e da ciência, hoje em dia tornou-se mais fácil ensinar cinema e estudar cinema em Portugal. Claro que continuam a ser necessários os bens leitores, os bons professores e os bons alunos, mas a Texto & Grafia está a desenvolver um trabalho muito positivo na edição portuguesa na área da imagem e do cinema.
                                       O Número de Ouro
         Além disto, quero deixar aqui uma outra sugestão de leitura. Acaba de sair em português "O Número de Ouro - A história de phi, o número mais assombroso do mundo", do astrónomo Mario Livio (Gradiva, Lisboa, 2012), sobre a famosa proporção de ouro ou secção de ouro que, embora ele não o diga, foi (Sergei Eisenstein, que a usou e teorizou) e continua a ser (o chinês Jia Zhang-ke, por exemplo) muito importante também no cinema (1). Este livro, que no original data de 2002, recebeu o Prémio Peano em 2003 e o Prémio Internacional Pitágoras para o Melhor Livro de Divulgação Matemática em 2004, o que dá uma ideia da sua importância científica, embora a edição portuguesa talvez beneficiasse se tivesse uma introdução.
          Não devo, porém, passar sem uma referência à Orfeu Negro, também de Lisboa e também uma editora recente, que depois de ter publicado "Lacrimae Rerum - Ensaios sobre Kieslowski, Hitchcock, Tarkovski e Lynch", de Slavoj Zizek, e o muito importante "Cem Mil Cigarros - Os Filmes de Pedro Costa", com coordenação de Ricardo Matos Cabo, se tem dedicado ao trabalho muito louvável de traduzir o francês Jacques Rancière, um dos grandes filósofos contemporâneos, para português, incluindo livros em que ele faz uma referência detalhada ao cinema - "O Espectador Emancipado" e "O Destino das Imagens". Estas são edições muito recomendáveis, naturalmente para estudos mais avançados do cinema, de uma editora muito recomendável.

Nota
(1) Cf Sergei Eisenstein, "L'organique et le pathétique", in "La non-indifférente nature/1", U.G.E., 10/18, Paris, 1976, pág 47.

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