“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Dispersivo

      "Sacro Gra" (2013) é um documentário de Gianfranco Rosi sobre a circular que circunda a cidade de Roma e os seus habitantes. Com dois anos de filmagens e oito meses de montagem, o filme ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza do ano passado.                  
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    Este curto historial não me impressiona especialmente pois, apesar de apresentar uma visão panorâmica sobre os habitantes ao longo da circular e da ausência de música na banda-sonora (o que está bem), durante a primeira hora o cineasta procura as imagens mais belas, não as mais verdadeiras, as personagens mais típicas, não as mais autênticas, mantendo assim uma exterioridade quase indiferente aos dramas humanos que apresenta, como num retrato turístico do que em Roma o turista não vê.
     Porém, na última meia-hora, depois da sequência dos mortos e do cemitério, o filme alonga-se sobre o mais banal, pequeno e insignificante, e a câmara arrisca uma maior proximidade das personagens, o que, abstraindo mais do local, permite um maior distanciamento em relação ao meio descrito, na direcção de uma maior verdade em breves notações. Então sim, "Sacro Gra", postos de lado os aspectos formais mais vistosos, mesmo as boas ideias de montagem como colagem da parte anterior, e mantendo a ausência de música salvo no final, define e descreve uma paisagem humana mais tocante e verdadeira.                  
                     sacro-gra
      Assim Gianfranco Rosi ultrapassa na última parte a falta de personagem central que sirva de fio condutor e agarra o significado da própria insignificância individual, reduzida mas também ampliada na sua dispersiva existência dada de modo fragmentário.
      Falta, contudo, a este filme o lado de experiência vivida, que o poderia transfigurar e estava presente em "Roma de Fellini"/"Roma" (1972), o seu possível modelo fora do documetário, permanecendo a maior parte do tempo exterior e quase indiferente, salvo perante o obviamente mais chocante mas também o mais vistoso.      

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