“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

sábado, 17 de agosto de 2013

Um cineasta sério

       O filme que Edward Zwick fez a seguir a "Diamante de Sangue"/"Blood Diamond", 2006 (ver "Negra África Negra, 12 de Fevereiro de 2012) intitula-se "Resistentes"/"Defiance", 2008, e é um filme muito bom que o confirma como um cineasta sério com o qual se deve contar no actual panorama do cinema americano.
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     Confirmando ser um cineasta de temas difíceis, neste filme em cujo argumento participou, como tem feito em todos os seus filmes desde "Estado de Sítio"/"The Siege" (1998), Zwick ocupa-se de um episódio verídico até há pouco desconhecido, previamente relatado em livro ("Defiance: the Bielski Partisans", de Nechama Tec), da Resistência ao ocupante nazi na Bielorrússia soviética durante a II Guerra Mundial, em que estão em causa judeus perseguidos por razões raciais conhecidas. Os irmãos Bielski, Tuvia/Daniel Craig, Zus/Liev Schreiber e Asael/Jamie Bell, depois da morte dos seus pais formam um grupo de resistência com o seu nome, em primeiro lugar destinado a salvar os judeus ameaçados.
      Tudo decorre de acordo com o previsto até o segundo resolver deixar o grupo para se juntar à resistência soviética, que ataca directamente as forças invasoras, e esse é um momento forte relativo a um dilema sério. O casamento de Asael, em montagem alternada com um ataque em que Zus participa, vai trazer o irmão mais novo para um papel mais importante, que se vem a tornar decisivo naquele grupo que, em benefício da sua humanidade, acolhe as mulheres a que reconhece um papel muito importante (sobre a ocupação da Bielorrússia pela Alemanha nazi, ver "Um sentido sensível", 15 de Julho de 2013).  
                    Defiance
         Edward Zwick faz este seu filme de uma maneira invulgar para um filme de guerra, pois mantém frequentemente a sua câmara, de novo com o português Eduardo Serra como director de fotografia, muito próxima dos rostos dos actores, o que além de dar uma maior intimidade com as personagens exige mais aos actores, numa realização, salvo nos momentos de combate, nomeadamente no final, sem recurso ao grande espectáculo, muito boa e segura de modo a não deixar esmorecer o dramatismo.
      É importante chamar a atenção para este filme porque ele trata de uma maneira extremamente digna um episódio muito importante com base no qual os seus protagonistas não procuraram reconhecimento, porque é um filme que, na sua secura e no seu classicismo, atinge a emoção pelas melhores razões e pelos melhores meios dramáticos, e porque é realizado por um cineasta sério, com uma obra já importante atrás de si sem que para o seu nome tenha chamado especial atenção até agora. Iniciado com imagens documentais, "Resistentes" é um filme muito aconselhável porque não dá uma visão idílica nem da guerra nem da Resistência, especialmente oportuno numa época em que há quem, contra a evidência da História do Século XX, estupidamente queira  recuperar o nazismo, e em que se verifica um preocupante alastrar de ideias neo-nazis e racistas, com consequências ameaçadoras, muito perigosas.    
                   Defiance
       A dignidade e o heroísmo da Resistência, com todos os seus sérios conflitos internos e com todos os seus enormes sacrifícios, está aqui retratada de maneira fidedigna e sem qualquer complacência com o inimigo nem com o colaboracionismo, com actores muito bons, incluindo Daniel Craig no seu melhor, numa interpretação difícil e superior. E a luz na floresta em que "Resistentes" decorre, que os protagonistas comentam no final ser "uma floresta bonita", foi trabalhada com grande sabedoria pelo mais internacional dos portugueses do cinema mundial.
       A este nível, o de Edward Zwick, um cineasta sério é, a partir de onde olho, sinónimo de um grande cineasta. A seguir com atenção.

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