“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

terça-feira, 24 de junho de 2014

Uma rapariga insignificante

     "The Housemaid"/"Hanyo" (2010) é a sexta longa-metragem do sul-coreano Sang-soo Im, um remake do filme homónimo de Ki-young Kim (1919-1998) datado de 1960 e considerado um clássico do cinema do seu país. No novo filme o cineasta, também argumentista, transforma a trama narrativa original de modo a tornar a criada do título, Eun-yi Li/Do-yeon Jeon, vítima da conspiração contra si armada pela mulher, Hae-ra/Woo Seo, e a sogra/Ji- Young Park de Hoon-Goh/Jung-Jae lee, o dono da casa que lhe faz um filho enquanto espera que a mulher dê à luz um par de gémeos.
                                 
   Com uma narrativa muito boa embora mais convencional do que a do filme original, "The Housemaid" de Sang-soo Im é muito bem construído sobre o interior da casa da família próspera para a qual a jovem Eun-yi vai trabalhar, com um aproveitamento excepcional de aspectos arquitectónicos que definem o espaço e recortam o ambiente em que decorre o conflito, e em que a filha mais velha do casal, Nami/Seo-Hyeon Ahn, estabelece com ela uma relação de cumplicidade, tudo perante o olhar impassível de governanta, Byung-sik/Yeo-jeong Yoon, que tudo sabe mas só diz o que quer. Nesta história de mulheres o único homem, Hoon-Goh, toca Beethoven à noite e mostra-se à altura do que seria de esperar da sua idade e da sua condição. 
    Os laços que se estabelecem entre a criada e a governanta, entre a criada e a filha mais velha dos patrões estabelecem o contraponto com a aberta hostilidade de mãe e filha para com Eun-yi, gerando um equilíbrio narrativo em que o balançar progressivo da governanta e a tomada de decisão, e o resvalar da protagonista para a vingança acompanham a audácia da realização até um final que rivaliza com o do filme primitivo.
                    The housemaid
     Instintual e primitivo debaixo das aparências sociais que justamente evidencia, "The Housemaid" é um filme profundamente crítico da Coreia do Sul actual e soberbamente dirigido  por Sang-soo Im, que sabe muito bem que o problema local que trata tem uma dimensão universal, o que torna este um filme indispensável.

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