“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

domingo, 11 de janeiro de 2015

Comemorativo

      Pretendendo-se comemorativo da cidade de Sarajevo, o filme em episódios "Pontes de Sarajevo"/"Les Ponts de Sarajevo" (2014) apresenta-se com a dignidade exigida por uma história atribulada ao longo do Século XX. Composto por 13 curtas-metragens de 13 realizadores diferentes, cada uma delas tem pelo menos um apontamento curioso e de maior relevo que a destaca e a ligação entre os diferentes episódios está muito bem feita em animação.
                    séquences animées Les ponts de Sarajevo
     Anoto apenas que esta comemoração em filme é um tanto fúnebre em termos cinematográficos, pois salvos os episódios do romeno Cristi Puiu, "Réveillon", do francês Jean-Luc Godard, "Le pont des soupirs", do bielorruso Sergei Loznitsa, "Réflexions", e da portuguesa Teresa Villaverde, "Sara et sa mére", tudo se passa no uso de uma indierenciada linguagem audiovisual, apenas vagamente reminiscente do cinema.                 
          Não vem daí mal ao mundo nem ao cinema, que passa bem a prova de mais um funeral, ele que tem tido várias vidas e várias mortes, mas é de facto flagrante o contraste que aqueles quatro segmentos estabelecem em termos de cinema - Cristi Puiu com um uso assombroso do plano-sequência na penumbra de um quarto de casal; Godard com a sua famosa mistura audiovisual sobre o texto de um filme seu, uma composição musical (Beethoven) e uma canção (Paco Ibañez); Loznitsa com imagens fotográficas de rostos que nos olham em sobre-impressão com imagens em movimento, tudo a preto e branco; Villaverde filmando o intemporal no efémero, quando não apenas a arte, como pretende Jean-Luc, mas a própria cultura está ameaçada, encerrada, inacessível.
                    les-ponts-de-sarajevo (1)
       Também não virá mal ao mundo que eu aqui o observe sem o lamentar, porque nestes seus funerais o cinema está sempre muito bem representado, como em "Pontes de Sarajevo" mais uma vez acontece. Não sei o que se fará na comemoração do segundo centenário do início da I Guerra Mundial em Sarajevo, cujo primeiro centenário este filme  evoca, mas com esta velocidade de transformação e substituição de linguagens será certamente muito diferente deste filme, assim tanto mais histórico.                
       (Sobre Cristi Puiu ver "Percurso exemplar", de 14 de Abril de 2012; sobre Jean-Luc Godard ver "Godard, o passado e o presente", de 17 de Junho de 2012, e "Outro filme histórico", de 30 de Abril de 2014; sobre Sergei Loznitsa ver "Um sentido sensível", de 15 de Julho de 2013; sobre Teresa Villaverde ver "Da vida dos espectros", de 12 de Fevereiro de 2012.)

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