“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

José Fonseca e Costa (1933-2015)

     Foi um dos nomes fundadores do novo cinema português dos anos 60/70 e um dos cineastas portugueses mais intransigentemente pessoais e melhor conhecidos do público por filmes de uma narratividade fluente com variados e picantes motivos de interesse.
                    José Fonseca e Costa Sem Sombra de Pecado cinemateca portuguesa
    Tendo-se estreado na longa-metragem de ficção com "O Recado" (1972), um filme declaradamente de resistência, a que se seguiu "Os Demónios de Alcácer Quibir (1977), também marcado politicamente, sobre o colonialismo, a sua obra veio a atingir expressão plena e maior divulgação com "Kilas, o Mau da Fita" (1980), com o seu gosto do musical, "Sem Sombra de Pecado" (1983), baseado no conto "E aos Costumes Disse Nada", de David Mourão-Ferreira, com o seu travo de melodrama, "Balada da Praia dos Cães" (1988), baseado no romance homónimo de José Cardoso Pires, com o seu turvo tom de policial e de político, "A Mulher do Próximo" (1988), com o seu tom de comédia de costumes. Nos anos 90 dirigiu "Os Cornos de Cronos" (1991) e "Cinco Dias, Cinco Noites" (1996), baseado na novela de Manuel Tiago/Álvaro Cunhal, que nas suas mãos encontrou rumo cinematográfico à altura.
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     Já neste século fez "Fascínio" (2003) e "Viúva Rica Soltera Não Fica" (2006), um filme com traços de memórias, com "O Recado" e "Cinco Dias, Cinco Noites" o meu preferido numa obra multifacetada em que não se contam filmes menores.
     Grande narrador, quase sempre ou argumentista ou co-argumentista dos seus filmes (só o não foi de "Os Cornos de Cronos", que teve argumento de Américo Guerreiro de Sousa), e grande director de actores, sempre com um assinalável brio cinematográfico, para o qual contribuíram repetidas colaborações de Acácio de Almeida e Eduardo Serra, os melhores directores de fotografia portugueses, José Fonseca e Costa marcou uma época muito importante no cinema português com filmes eminentemente partilháveis e do agrado do público. Sempre fiel ao seu próprio gosto, politicamente audacioso desde o início, ele soube manter ao longo de toda a sua vida uma coerência que ia de par com uma ponta de rebeldia e irreverência nos seus filmes, o que tornava cada um deles um especial objecto de culto por razões específicas.
                   A atriz Bianca Byington durante cena de "Viúva Rica Solteira Não Fica" (2006), dirigido por José Fonseca e Costa
       Com ele trabalharam alguns dos melhores actores portugueses de diferentes gerações: José Viana, Maria Cabral, João Guedes, Zita Duarte, Artur Semedo, Fernando Gusmão, Rogério Paulo, Raul Solnado, Carmen Dolores, Mário Viegas, Lia Gama, João Perry, Armando Cortez, Isabel de Castro, Henrique Viana, Virgílio Teixeira, Inês de Medeiros, Pedro Hestnes, Maria do Céu Guerra, Paula Guedes, Sinde Filipe, Vítor Norte, Laura Soveral, Canto e Castro, Paulo Pires, Cucha Carvalheiro (sua irmã, a quem neste momento expresso o meu muito sentido pesar), Rogério Samora e Diogo Dória, entre muitos outros - além de Lima Duarte, Victoria Abril, Assumpta Serna, Patrick Bauchau, Sergi Mateu, Fernanda Torres, Carlos Vereza, Bianca Byington -, o que foi muito importante para um cineasta que gostava dos actores. 
       Na saída de cena de mais um grande nome do cinema português, especialmente importante e influente, reconhecido internacionalmente, a minha sentida homenagem a José Fonseca e Costa e o conselho de que vejam todos os seus filmes - também as curtas ("A Metafísica dos Chocolates", 1967, foi o seu primeiro filme que vi), os documentários e os filmes para televisão - e aprendam com a sua dignidade a dignidade do cinema como arte maior, numa obra trabalhada pela ironia e imbuída de espírito crítico, em que se destaca uma poética dos actores.

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