O austríaco Michael Glawogger (1959-2014), que morreu de malária em Monróvia, na Libéria, no dia 23 de Abril passado, deixou atrás de si uma obra notável de que se destaca o documentário "A Morte do Homem Trabalhador"/"Workingman's Death" (2005), em que trata de forma desassombrada os extremos a que é levada a condição de trabalhador nos nossos dias.
Percorrendo o mundo aí onde a condição de trabalhador mais dói, mesmo perante os paradigmas que durante a primeira metade do século XX a exaltaram, que evoca em imagens documentais, o cineasta mostra sem paliativos ou ambiguidades a crua situação de quem trabalha nas situações mais penosas, difíceis e brutais. Da Ucrânia à Indonésia, da Nigéria ao Paquistão mostra o quotidiano de quem trabalha em minas de carvão, na cratera de um vulcão, num matadouro, no desmantelamento de um cargueiro nas piores condições de salubridade e com muito escasso tempo para si próprio. E ao fazê-lo permite-nos aceder ao âmago de comunidades brutalizadas no início do Século XXI, sem acesso aos mais elementares benefícios trazidos pelo Século XX, sem direitos e privadas das novas tecnologias da informação.
São todos gente pobre e que não tem outra possibilidade de vida que o trabalho, como diz um trabalhador do matadouro. O último segmento de "A Morte do Homem Trabalhador", mais curto e passado na China, vem estabelecer um outro ponto de vista que uma sociedade dinâmica e em progresso permite, com a generalizada maquinização do anterior trabalho e a consequente ameaça de passagem de uma siderurgia para o passado, a história, o que o epílogo, na Alemana, confirma com a transformação de um complexo industrial num vasto espaço de diversões.
Ficam deste filme sobretudo as imagens de um trabalho violento e muito duro, sem alternativas nas economias mais atrasadas e em vias de extinção nas mais avançadas, e as palavras e imagens de sociedades avançadas, mesmo em fase pós-industrial, em que a questão do trabalho e do trabalhador passou a ser encarada de outra maneira. Faltam-lhe, contudo, como é inevitável, as imagens posteriores à crise de 2008, com o aumento do "exército de reserva" de desempregados em todo o mundo, a proletarização de uma classe média e a crise instalada em sociedades que se julgavam prósperas.
Mas mesmo este aspectos resultantes de uma situação posterior ao filme são por ele implicitamente comentados ao mostrar como em tempos de grande progresso tecnológico vastas populações permanecem amarradas a modos antigos de trabalhar, extremamente exigentes fisicamente, mas gratas por terem esse trabalho pois é ele que lhes permite continuarem a viver. E que nem o trabalho nem o trabalhador acabaram demonstra-o o facto de, antigo ou moderno, todos nós precisarmos dele.
Michael Glawogger tem o mérito de neste documentário procurar as melhores imagens, o melhor enquadramento visual, os melhores diálogos e depoimentos, sem em momento algum tentar tirar proveito, nomeadamente pela estetização, daqueles e daquilo que mostra. No justo tom assim conseguido, "A Morte do Homem Trabalhador" soa como um "toque de rebate" pelo trabalhador no seu entendimento tradicional mas também como um esclarecimento e um alerta para situações concretas e actuais de que convém termos conhecimento e consciência se não queremos viver apenas atordoados pela actual sociedade do espectáculo, da comunicação mas também da penúria intelectual e humana.
Como cineasta, Glawogger ocupou o seu espaço próprio no cinema em especial no documentário e por este filme podemos ficar a conhecer uma parte do melhor da obra que nos deixou após a sua partida precoce, que aqui lamento sentidamente em si mesma e pelo que impediu que continuasse a fazer. Este filme, que devia ser mostrado mais vezes, passou no passado Domingo no Arte em homenagem ao cineasta. Chamo neste momento a vossa especial atenção para "Megacities" (1998) e "Whores' Glory" (2011), outros dois importantes documentários de Michael Glawogger feitos segundo o mesmo princípio de "A Morte do Homem Trabalhador" de filmar em diferentes partes do mundo.
São todos gente pobre e que não tem outra possibilidade de vida que o trabalho, como diz um trabalhador do matadouro. O último segmento de "A Morte do Homem Trabalhador", mais curto e passado na China, vem estabelecer um outro ponto de vista que uma sociedade dinâmica e em progresso permite, com a generalizada maquinização do anterior trabalho e a consequente ameaça de passagem de uma siderurgia para o passado, a história, o que o epílogo, na Alemana, confirma com a transformação de um complexo industrial num vasto espaço de diversões.
Ficam deste filme sobretudo as imagens de um trabalho violento e muito duro, sem alternativas nas economias mais atrasadas e em vias de extinção nas mais avançadas, e as palavras e imagens de sociedades avançadas, mesmo em fase pós-industrial, em que a questão do trabalho e do trabalhador passou a ser encarada de outra maneira. Faltam-lhe, contudo, como é inevitável, as imagens posteriores à crise de 2008, com o aumento do "exército de reserva" de desempregados em todo o mundo, a proletarização de uma classe média e a crise instalada em sociedades que se julgavam prósperas.
Mas mesmo este aspectos resultantes de uma situação posterior ao filme são por ele implicitamente comentados ao mostrar como em tempos de grande progresso tecnológico vastas populações permanecem amarradas a modos antigos de trabalhar, extremamente exigentes fisicamente, mas gratas por terem esse trabalho pois é ele que lhes permite continuarem a viver. E que nem o trabalho nem o trabalhador acabaram demonstra-o o facto de, antigo ou moderno, todos nós precisarmos dele.
Michael Glawogger tem o mérito de neste documentário procurar as melhores imagens, o melhor enquadramento visual, os melhores diálogos e depoimentos, sem em momento algum tentar tirar proveito, nomeadamente pela estetização, daqueles e daquilo que mostra. No justo tom assim conseguido, "A Morte do Homem Trabalhador" soa como um "toque de rebate" pelo trabalhador no seu entendimento tradicional mas também como um esclarecimento e um alerta para situações concretas e actuais de que convém termos conhecimento e consciência se não queremos viver apenas atordoados pela actual sociedade do espectáculo, da comunicação mas também da penúria intelectual e humana.
Como cineasta, Glawogger ocupou o seu espaço próprio no cinema em especial no documentário e por este filme podemos ficar a conhecer uma parte do melhor da obra que nos deixou após a sua partida precoce, que aqui lamento sentidamente em si mesma e pelo que impediu que continuasse a fazer. Este filme, que devia ser mostrado mais vezes, passou no passado Domingo no Arte em homenagem ao cineasta. Chamo neste momento a vossa especial atenção para "Megacities" (1998) e "Whores' Glory" (2011), outros dois importantes documentários de Michael Glawogger feitos segundo o mesmo princípio de "A Morte do Homem Trabalhador" de filmar em diferentes partes do mundo.
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