"Minha Mãe"/"Mia madre", o mais recente filme de Nanni Moretti (2015), que se segue a "Habemus Papam - Temos Papa"/"Habemus Papam" (2011) na sua obra, revela mais uma vez uma mestria que já nem sequer é inesperada nele. Depois da morte do filho, em "O Quarto do Filho"/"La stanza del figlio" (2001), é pela experiência da morte da mãe que o cineasta passa de forma muito, cada vez mais discreta, em surdina.
Deixando a parte principal para a irmã, Margherita/Margherita Buy, realizadora de cinema enquanto trabalha nas filmagens de um novo filme, o cineasta remete-se como actor para um discreto irmão, Giovanni, que acompanha mais de perto a idosa e doente mãe, hospitalizada, Ada/Giulia Lazzarini, para o que chega a pedir uma licença sem vencimento no seu emprego (que depois tenta passar a algo mais radical).
Mas muito curiosamente Moretti transfere para outrem o papel que lhe deveria caber, o de realizador de cinema, o que lhe permite, como cineasta, ver mais e ver melhor nos problemas com que Margherita se defronta no trabalho, nomeadamente com um actor americano de segunda ordem mas muito convencido, Barry Huggins/John Turturro, e com os seus flashes de sonho, de alucinação, medo e desejo. Quer o filme a ser feito quer os sonhos da sua realizadora introduzem uma outra, segunda ou terceira dimensão em "Minha Mãe".
Mas muito curiosamente Moretti transfere para outrem o papel que lhe deveria caber, o de realizador de cinema, o que lhe permite, como cineasta, ver mais e ver melhor nos problemas com que Margherita se defronta no trabalho, nomeadamente com um actor americano de segunda ordem mas muito convencido, Barry Huggins/John Turturro, e com os seus flashes de sonho, de alucinação, medo e desejo. Quer o filme a ser feito quer os sonhos da sua realizadora introduzem uma outra, segunda ou terceira dimensão em "Minha Mãe".
Há ainda Livia/Beatrice Mancini, filha de Margherita e neta de Ada, que a propósito do latim que estuda e a avó ensinara com esta estabelece uma relação especial - a tal ponto que sobre ela a avó conhece o que a sua mãe desconhecia.
O foco em Margherita permite a Nanni Moretti tratar melhor de si e da sua experiência sem a pessoalizar em si próprio, criando com uma excelente Margherita Buy uma figura à beira de passar da neurose ao colapso total que um actor completamente inapto, além da situação clínica da mãe dela que se agrava e da sua progressiva queda na rotina profissional, favorece. E aí são, de facto, os flashes, os sonhos dela que, de uma forma consistente com o que acontece na obra do cineasta vêm pontuar e esclarecer uma experiência dos limites que ela atravessa com o escasso apoio do irmão, só consigo própria e com a sua falta de razão, até ao fim. Por seu lado, as instruções insistentes dela com os seus actores relevam de uma insatisfação que procura ultrapassar-se sempre através do mesmo método, pelo que passaram a fazer parte da sua rotina que ela quer combater.
Com uma grande secura cinematográfica, que nem a música, maioritariamente de Arvo Part anula, Nanni Moretti consegue um filme notável sobre mães e filhas que convivem dificilmente umas com as outras, e com os outros - sobre a ternura, a impaciência, o despero. A elipse da morte de Ada é notável, tal como o plano final de Margherita.
Incluindo uma alusão expressa num sonho de Margherita de "As Asas do Desejo"/"Der Himmel über Berlin", de Wim Wenders (1987), com a fila de espectadores a esperar pela entrada na sala para assistirem ao filme, Nanni Moretti confirma em "Minha Mãe" ser um dos maiores cineastas contemporâneos. Se a psicanálise pode ser, como em Woody Allen, uma boa, indispensável entrada na sua obra, ela não pode para o efeito ser usada de forma simplificada ou simplificadora (sobre Nanni Moretti ver "Um lugar vazio", de 4 de Março de 2012).
Incluindo uma alusão expressa num sonho de Margherita de "As Asas do Desejo"/"Der Himmel über Berlin", de Wim Wenders (1987), com a fila de espectadores a esperar pela entrada na sala para assistirem ao filme, Nanni Moretti confirma em "Minha Mãe" ser um dos maiores cineastas contemporâneos. Se a psicanálise pode ser, como em Woody Allen, uma boa, indispensável entrada na sua obra, ela não pode para o efeito ser usada de forma simplificada ou simplificadora (sobre Nanni Moretti ver "Um lugar vazio", de 4 de Março de 2012).