“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

O espaço entre

      "Bubble" é um filme com quase uma década (2005) que não teve estreia comercial entre nós e em que Steven Soderbergh se dedica a um dos seus exercícios mais pessoais, que tem alternado com filmes mais comerciais (ver "De primeira água", 11 de Fevereiro de 2012, "Bom tema, bom filme", 10 de Junho de 2012, e "Jogo fatal", 10 de Março de 2013).
                   
    Passado entre operários de uma fábrica de bonecas no Midwest, local inusitado que o marca decisivamente, entre eles o filme destaca e segue um triângulo improvável: a gorda Martha/Debbie Doebereiner, o instável Kyle/Dustin Ashley e a recém-chegada Rose/Misty Wilkins, com uma filha de 2 anos, que se vem intrometer na amizade que os liga. Interpretado por não-profissionais, tudo se joga na sobriedade expressiva dos actores e na dinâmica sóbria mas muito expressiva da realização.
   Explicando o menos possível sobre a motivação de cada um, "Bubble" deixa muito maior espaço ao espectador para, na fresta aberta entre o que mostra e o que, sugerido, esconde, interpretar, decifrar o que está por trás do comportamento de cada personagem. Com uma segura definição do espaço em que se inscrevem as personagens, definido pela distância certa a estas, e um ritmo que, distendido, a música e a montagem (com pontuações clássicas) criam, o filme apresenta-se forte e cativante, algures num espaço não identificado de cinema independente - com argumento de Coleman Hough (o mesmo de "Vidas a Nu"/"Full Frontal", 2002), tem fotografia e montagem do próprio cineasta (sob pseudónimo) e música de Robert Pollard.
                  
   Com simplicidade, secura e elegância, longe de Hollywood e das suas receitas de sucesso Steven Soderbergh prosseguiu aqui uma outra faceta da sua obra em que se tem exprimido mais à-vontade, sem constrangimentos de produção, o que lhe tem permitido ser experimental, inventivo e cinematograficamente muito bom em termos mais pessoais - a edição dvd em português tem como título "Bubble - Uma Nova Experiência de Steven Soderbergh". E penso que ele próprio assim tem conseguido respirar melhor e gerir melhor a sua actividade em Hollywood, que inclui a participação na produção de filmes relevantes.   

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