Transmitido pelo Arte, "Les stigmates du tueur"/"Staudamm" é a segunda longa-metragem do alemão Thomas Sieben (2012), co-autor do argumento com Christian Lyra. Trata-se de um filme extraordinário na sua própria anti-espectacular economia de meios no tratamento de um caso de massacre escolar ficcionado a partir de diversos casos reais ocorridos já este século na Alemanha.
![Staudamm Staudamm](http://www.moviepilot.de/files/images/movie/file/10804364/staudamm-10_article.jpg)
Descrevendo um trajecto semelhante ao de "Elephant", de Gus Van Sant (2003), este filme dele se afasta por não proceder a uma reconstituição extensiva dos acontecimentos nem mostrar o autor dos crimes em benefício do inquérito conduzido a posteriori por um inquiridor ocasional que pelo caso se interessa, Roman/Friedrich Mücke, a partir da sua chegada à localidade onde os acontecimentos tiveram lugar acompanhado por Laura/Liv Lisa Fries, que a eles assistiu.
Com um tom sóbrio e discreto sobre um ambiente com nuvens baixas, depois de diversos episódios dilatórios do inquérito de Roman mas que o favorecem (a demora na entrega de um dossier, a sua própria demora em aceitar ao convite de Laura para o fazer aceder aos locais) o filme chega ao que o assassino deixou escrito sobre si próprio, o que acaba por ser o seu ponto central. Depoimento fundamental de um jovem de 18 anos que se considera perdido, por ele percebemos como poderes diversos, escolares e clínicos incluídos, todos andam a iludir-se e a iludir-nos ao chegarem sistematicamente tarde a casos como este.
![Friedrich Mücke & Liv Lisa Fries in "Staudamm" Friedrich Mücke & Liv Lisa Fries in "Staudamm"](http://image.tittelbach.tv/article/3546-54c2aa02bd19c-thu.jpg)
Todos andam entretidos com o dinheiro, o poder, a fama, a guerra, deixando ao abandono, entregue a si própria, uma juventude que se sente ignorada e desprezada, da geração anterior apenas aquilo recebe e por isso em casos extremos faz esta ou outras opções radicais e aparentemente sem sentido. Há, com efeito, toda uma geração que, contando com o desprezo ou a desatenção de todos os responsáveis, vai fazendo o que acha dever fazer, mesmo se por isso pedindo desculpa, como no caso deste filme, em que o assassino se torna tanto mais presente quanto não é mostrado e que decorre num meio pequeno e fechado, acontece.
Sem nunca o mostrar abertamente, "Les stigmates du tueur" é um libelo violentíssimo contra estas sociedades do egoísmo e da vaidade, da passividade e da indiferença pelo indivíduo, que central ou localmente com ele apenas se preocupam em momentos de crise. Sem espectáculo, sem estardalhaço, numa linha quase bressoniana faz o processo de um caso extremo e, por intermédio dele, de sociedades pós-industriais e pós-humanas em que os indivíduos se limitam a números de uma contabilidade eleitoral ou estatística, sociedades que se preocupam prioriariamente com o deve e haver da dívida, a subida e a descida dos mercados, os avanços e recuos de guerras cuja origem se perde nas necrópoles do tempo.
Eu percebo que vocês estejam a pensar nos Oscars. Eu estou preocupado com isto, que surge cristalinamente no falso film noir que "Les stigmates du tueur" é. Falem sempre uns com os outros e cuidem-se. Depois não digam que "é a vida", porque é sobretudo, em isolamento e incomunicabilidade, a má vida.
![Staudamm - Plakat](http://www.critic.de/images/media-title-1bd90.jpg)
Eu percebo que vocês estejam a pensar nos Oscars. Eu estou preocupado com isto, que surge cristalinamente no falso film noir que "Les stigmates du tueur" é. Falem sempre uns com os outros e cuidem-se. Depois não digam que "é a vida", porque é sobretudo, em isolamento e incomunicabilidade, a má vida.
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