Claro que também eu estava à espera do regresso de Wong Kar-Wai à longa-metragem depois da sua incursão americana para fazer "My Blueberry Nights - O Sabor do Amor"/"My Blueberry Nights" (2007), que a meu ver nada de muito substancial adiantou ao seu grande díptico "Disponível para Amar"/"In the Mood for Love"/"Fa yeung nin wa" (2000) e "2046" (2004), em que definida e verdadeiramente confirmou o seu grande talento de cineasta. Vi agora o filme que assinala o seu regresso a Hong Kong, "O Grande Mestre"/"Yi dai zong shi" (2013), que não sendo nada de extraordinário permite ter um novo vislumbre desse talento.
Embora conheça alguns, nunca fui adepto dos filmes de artes marciais, e a minha atenção foi despertada por estar em causa um filme sobre kung fu feito por um grande cineasta. Com o pretexto biográfico de Ip Man/Tony Leung e do seu encontro com a filha do anterior grande mestre, Gong Er/Ziyi Zhang, que acaba por conseguir vencê-lo, o filme traça um percurso do kung fu e do seu código de honra da China dos anos 30 aos anos 50, mas é a forma como está visualmente construído que encerra o seu principal motivo de interesse.
De facto, Wong Kar-Wai tem a audácia de construir "O Grande Mestre" com base em grandes-planos, que apenas por momentos troca por planos médios ou planos americanos nas cenas de combate - o plano geral só surge muito esporadicamente. Daí resulta uma grande proximidade dos rostos dos actores, das personagens, o que cria um efeito muito curioso, de afecção, contra o mais comum nos filmes de kung fu, que é a acção. Sem se preocupar com isso, o cineasta procura recuperar no contexto do kung fu a estilização e o ritmo de montagem de "Disponível Para Amar", mas nem o assunto é o mesmo, apesar do aceno final ao melodrama, nem aquela forma de construir o filme permite o mesmo tratamento do espaço (aqui disperso por espaços diversificados), do tempo e das personagens.
Apesar de tudo se passar com grande domínio formal, com grande precisão que permite demonstrar a mestria no kung fu e a mestria do cineasta, a mestria de Wong Kar-Wai surge aqui numa versão atenuada e algo conformista, embora com assinatura pessoal. Misturar num mesmo filme o kung fu com a biografia, a história e o melodrama origina uma obra ambiciosa, ritmada mas mista, didáctica e no limite fastidiosa.
Eu sei que não é fácil regressar ao passado, mas como é dito no filme é preciso saber olhar para trás para identificar o melhor de um cineasta que desde "As Tears Go By"/"Wong gok ka moon" (1988), "Days of Being Wild"/"A Fei zheng zhuan" (1990), "Chungking Express"/"Chung Hing sam lam" e "As Cinzas do Tempo"/"Ashes of Time"/"Dung che sai duk" (1994) é reconhecido como um nome de referência do cinema chinês. Saudando o seu regresso, a esse nível, que ele culminou no mencionado díptico e aqui de maneira nenhuma atinge, o continuo a esperar.
Mesmo assim ficamos a conhecer o homem que foi o mentor do famoso Bruce Lee, o que sempre atrairá muitos. Por sua vez, a estilização do filme e a qualidade do olhar, distante e próximo, do cineasta permitem continuar a esperar o melhor de Wong Kar-Wai.
Mas hoje curvo-me perante um outro mestre, Eusébio da Silva Ferreira (1942-2014), futebolista excepcional a cuja memória aqui presto sentida homenagem.
Mesmo assim ficamos a conhecer o homem que foi o mentor do famoso Bruce Lee, o que sempre atrairá muitos. Por sua vez, a estilização do filme e a qualidade do olhar, distante e próximo, do cineasta permitem continuar a esperar o melhor de Wong Kar-Wai.
Mas hoje curvo-me perante um outro mestre, Eusébio da Silva Ferreira (1942-2014), futebolista excepcional a cuja memória aqui presto sentida homenagem.
Sem comentários:
Enviar um comentário