“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

domingo, 18 de novembro de 2012

James Bond 50 anos

            Iniciada em 1962, com “Dr. No”, de Terence Young e com Sean Connery, a saga no cinema de James Bond, a personagem criada por Ian Fleming em 1952, atingiu este ano 50 anos com a estreia de “Skyfall”, de Sam Mendes e com Daniel Craig. O tempo passa para todos, e também para o agente 007, cujas aventuras no cinema percorreram um longo e vário caminho ao longo destas 5 décadas, sem que a personagem tenha perdido a sua popularidade e o seu carisma apesar das diversas mãos por que passou. Eu explico-me sumariamente.
                    
            O James Bond original no cinema foi um achado que marcou uma época em grande parte devido ao actor que então se revelava, mas em larga medida também devido ao realizador dos dois primeiros filmes e do quarto, Terence Young, um cineasta hábil e generoso que soube tirar da personagem e das suas aventuras no mundo da espionagem o melhor partido. Por sua vez, Sean Connery foi James Bond em 6 filmes mais 1: “007 – Agente Secreto”/“Dr. No” (1962) e “007 - Ordem para Matar”/“From Russia with Love” (1963), ambos de Terence Young, “007 – Contra Goldfinger”/“Goldfinger” (1964) de Guy Hamilton, “007 – Operação Relâmpago”/“Thunderball” (1965), de novo de Terence Young, “007 – Só Se Vive Duas Vezes”/“You Only Live Twice” (1967), de Lewis Gilbert, “007 – Os Diamantes São Eternos”/“Diamond are Forever” (1971), de Guy Hamilton, e “Nunca Mais Digas Nunca”/”Never Say Never Again” (1983), de Irving Kershner – este fora da série oficial, como o tinha sido um “Casino Royale” (1967) co-dirigido por vários realizadores, entre os quais John Huston, com, entre outros, Peter Sellers, David Niven, Ursula Andress e Orson Welles. Depois os filmes passaram para as mãos de outros realizadores menos hábeis, para actores sem o carisma e a classe do original. Digo-o com todas as letras: Bond decaiu quando interpretado por um péssimo George Lazenby, em “007 – Ao Serviço de Sua Mejestade”/”On Her Majesty’s Secret Service” (1969), de Peter R. Hunt, ou por um actor menor, embora com certo charme, como foi Roger Moore  - “007 - Vive e Deixa Morrer”/”Live and Let Die” (1973) e “007 - O Homem da Pistola Dourada”/”The Man with the Golden Gun” (1974), ambos de Guy Hamilton, “007 – Agente Irresistível”/”The Spy who Loved Me” (1977) e “007 – Aventura no Espaço”/”Moonraker” (1979), ambos de Lewis Gilbert, “007 – Missão Ultra-Secreta”/ “For Your Eyes Only” (1981), “007 – Operação Tentáculo”/Octopussy” (1983) e “007 – Alvo em Movimento”/”A View to a Kill” (1985), os três de John Glen, que também dirigiu “007 – Risco Imediato”/”The Living Daylights” (1987) e “007 – Licença para Matar”/”Licence to Kill” (1989), ambos com Timothy Dalton - e só ressurgiu quando a personagem foi confiada de novo a actores com outras, melhores qualidades, como Pierce Brosnan primeiro - 4 vezes, em “GoldenEye” (1995), de Martin Campbell, “007 – O Amanhã Nunca Morre”/“Tomorrow Never Dies” (1997), de Roger Spottiswood, “007 - O Mundo Não Chega”/“The World Is Not Enough” (1999), de Michael Apted, e “007 – Morre Noutro Dia”/“Die Another Day” (2002), de Lee Tamahori - e Daniel Craig depois - 3 vezes até hoje, em “Casino Royal” (2006), de Martin Campbell, “Quantum of Solace” (2008), de Marc Foster, e agora “Skyfall” (2012), de Sam Mendes. 
                      Ursula Andress famously emerged from the sea in her white bikini in Dr No
            Sam Mendes pode não parecer a escolha mais evidente para dirigir “Skyfall”, mas o certo é que ele se sai muito bem na arquitectura visual de uma aventura diversificada e fascinante, em que o próprio inimigo sai das fileiras do MI6. Isto merece algumas palavras.
           Ficaram conhecidas as Bond girls, que fizeram parte do encanto dos primeiros filmes, e uma imagem de marca da série no primeiro filme é a saída de Ursula Andress das ondas do mar para a praia. E esse lado desvaneceu-se bastante nos últimos filmes. Um outro, e crucial, ponto forte dos Bond-filmes foram, desde o início, as cenas de acção, e aí ficou justamente célebre a luta no comboio em ”From Russia with Love”. Neste aspecto, os últimos filmes, e em especial este último, mantêm essa tradição. Isto faz, contudo, pensar, na personagem do mau, ou do super-vilão, do adversário de James Bond, que nos primeiros filmes foi sempre muito bom – Joseph Wiseman, Lotte Lenya e Robert Shaw, Gerd Frobe, Adolfo Celi - e que nos dois últimos foi confiado de novo a grandes actores, Mathieu Amalric e agora Javier Bardem.
                     From Russia With Love [1964]              
           Mas será preciso chamar também, e de modo especial, a atenção para as diferenças entre os actores principais, um Sean Connery sempre seguro de si e que transmitia confiança, um Pierce Brosnan flleumático e vigilante e um Daniel Craig mais inseguro, menos afirmativo na aparência, aqui especialmente fragilizado, mas que vem sempre a tomar conta das situações, de que está sempre à altura. Depois há as figuras acessórias mas indispensáveis: de M, que começou por ser entregue a Bernard Lee e que em “Skyfall” Dame Judi Dench interpreta pela última vez, enquanto o próximo, Ralph Fiennes, é apresentado; de Q, agora um muito jovem especialista em jogos e outros gadgets informáticos; e da secretária Moneypenny, que aqui surge apenas no final.
              Em “Skyfall” há grandes momentos de acção logo desde o início, com a perseguição em Istambul que acaba num comboio, numa possível alusão a “From Russia with Love”, a passagem por Shanghai e Macau, onde o adversário se revela – e a sua aparição é um bom momento de cinema -, depois em Londres, em que avulta uma muito bem encenada perseguição no metro, para tudo terminar para todos em Skyfall, onde o mau, Silva, morre à mãos de Bond e M nos braços deste – muito bem Judi Dench.  
                     
          Um filme de James Bond não pode ser avaliado apenas em função de critérios gerais, embora mesmo perante esses critérios “Skyfall” tenha momentos muito bons, já que é toda a mitologia da personagem que está em causa e é em função dela que cada filme deve ser também visto. Nesta dupla medida, há que reconhecer que este último James Bond, de cinquentenário, é um bom filme de acção e melodrama, que consegue superar-se em benefício da acção trágica que nele acaba por prevalecer. Eu, que nunca fui especial admirador dos filmes de Sam Mendes, passarei agora a olhá-los de outra maneira. Quanto a Daniel Craig, o novo ar de irrisão que ele aqui traz ao protagonista assegura bem o lado trágico do filme e assinala, sem dúvida, um momento importante nesta saga. Por último, a presença no argumento de John Logan, que já trabalhou com Ridley Scott, Martin Scorsese e Tim Burton, é talvez responsável pela qualidade invulgar deste último Bond-filme a nível narrativo – uma presença que se anuncia ser para prosseguir nos próximos filmes - e a canção de Adele fica-lhe muito bem.
           "Skyfall" é, portanto e em conclusão, o melhor dos últimos filmes de James Bond e está inteiramente à altura do cinquentenário que comemora.

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