Durante o Indie Lisboa 2014 pude assistir a dois filmes de realizadores asiáticos que particularmente admiro: "Blind Detective"/"Man Tam", de Johnnie To (2013), que é um divertimento inteligente de um grande cineasta (ver "Um outro samurai", 7 de Fevereiro de 2013), e "Nobody's Daughter Haewon"/"Nugu-ui Ttal-do Anin Haewon", de Hong Sang-soo (2013), que é um grande filme de um grande cineasta (ver "Pintor de nuvens", 4 de Novembro de 2012, e "Três vezes Anne", 10 de Junho de 2013).
Com assombrosa subtileza, o cineasta sul-coreano constrói o seu filme como sonho da sua jovem personagem, e em termos narrativos e fílmicos desdobra-o em duplicações a partir da sequência central, dada em plano fixo muito longo, do jantar da protagonista com os colegas e o professor com quem teve um caso, situada no final do primeiro terço do filme: duas visitas ao forte, que ambas se desenrolam em poucos planos longos e ambas acabam com o mesmo plano longo do professor sentado, visto de costas e em lágrimas, mas também um segundo professor que trabalha na América, em San Diego, e que pede a Haewon que o acompanhe.
Num filme que começara sob a égide da figura feminina, a mãe de Haewon de partida para o Canadá, e com a flagrante ausência da figura paterna, o homem mais velho que o professor é assume explicitamente a função e o lugar da figura paterna omitida, com extrema, exacta pertinência dada na duplicação de figuras.
De construção rigorosa, muito inteligente e muito segura, "Nobody's Daughter Haewon" é uma verdadeira pérola na obra do mais importante cineasta sul-coreano da actualidade, com uma permanente atenção aos pormenores quer na imagem quer nos diálogos (e o argumento volta a ser do próprio cineasta) e um recorrente apelo a cumplicidades distantes: Jane Birkin no início, conversando com a protagonista sobre a sua filha, Charllote Gainsbourg, Martin Scorsese ao telefone com o professor que trabalha na América.
Para completar o quadro, Haewon é aluna de uma escola de cinema e o professor é tratado também por "realizador" durante o jantar com os alunos, além do que se repete a cena no exterior da livraria e ao longo de todo o filme são evidenciados na imagem os livros. Com sobriedade cinematográfica e grande sabedoria, Hong Sang-soo termina o seu filme com o regresso à protagonista adormecida que desperta, deixando pelas suas palavras inequívoco que o que vimos foi o sonho dela.
Este é, portanto um dos melhores filmes de um dos melhores cineastas da actualidade. E o Indie Lisboa, que daqui saúdo, é o único local em que filmes como estes podem ser vistos em Portugal.
Com assombrosa subtileza, o cineasta sul-coreano constrói o seu filme como sonho da sua jovem personagem, e em termos narrativos e fílmicos desdobra-o em duplicações a partir da sequência central, dada em plano fixo muito longo, do jantar da protagonista com os colegas e o professor com quem teve um caso, situada no final do primeiro terço do filme: duas visitas ao forte, que ambas se desenrolam em poucos planos longos e ambas acabam com o mesmo plano longo do professor sentado, visto de costas e em lágrimas, mas também um segundo professor que trabalha na América, em San Diego, e que pede a Haewon que o acompanhe.
Num filme que começara sob a égide da figura feminina, a mãe de Haewon de partida para o Canadá, e com a flagrante ausência da figura paterna, o homem mais velho que o professor é assume explicitamente a função e o lugar da figura paterna omitida, com extrema, exacta pertinência dada na duplicação de figuras.
De construção rigorosa, muito inteligente e muito segura, "Nobody's Daughter Haewon" é uma verdadeira pérola na obra do mais importante cineasta sul-coreano da actualidade, com uma permanente atenção aos pormenores quer na imagem quer nos diálogos (e o argumento volta a ser do próprio cineasta) e um recorrente apelo a cumplicidades distantes: Jane Birkin no início, conversando com a protagonista sobre a sua filha, Charllote Gainsbourg, Martin Scorsese ao telefone com o professor que trabalha na América.
Para completar o quadro, Haewon é aluna de uma escola de cinema e o professor é tratado também por "realizador" durante o jantar com os alunos, além do que se repete a cena no exterior da livraria e ao longo de todo o filme são evidenciados na imagem os livros. Com sobriedade cinematográfica e grande sabedoria, Hong Sang-soo termina o seu filme com o regresso à protagonista adormecida que desperta, deixando pelas suas palavras inequívoco que o que vimos foi o sonho dela.
Este é, portanto um dos melhores filmes de um dos melhores cineastas da actualidade. E o Indie Lisboa, que daqui saúdo, é o único local em que filmes como estes podem ser vistos em Portugal.
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