O último filme do francês Arnaud Desplecchin, "Jimmy P: Realidade e Sonho"/"Jimmy P." (2013), que só agora consegui ver, confirma plenamente o cineasta como um dos nomes mais importantes do cinema contemporâneo (ver "Um cinema da exigência", 11 de Fevereiro de 2012). Dois elementos que caracterizam o cineasta estão, de facto, presentes neste seu novo filme: a importância da palavra, dos diálogos, e o lugar central dos actores.
Na adaptação de um livro baseado na experiência real de um psicanalista judeu, apresentado como antropólogo, com um índio americano traumatizado da II Guerra Mundial, "Reality and Dreams", de Georges Devereux, o cineasta documentou-se exaustivamente sobre a época e a questão abordada (nomeadamente "Let There Be Light", de John Huston, 1946) por forma a fazer emergir um terceiro elemento característico da sua obra: o trazer à consciência o que nos recônditos do inconsciente se esconde.
Juntando, num frente a frente notável, dois representantes de populações vítimas de genocídio, o índio Jimmy Picard/ Benecio Del Toro e o judeu Georges Devereux/Mathieu Amalric num duelo que os actores tornam notável, "Jimmy P: Realidade e Sonho" descreve e narra os diferentes degraus entre um diagnóstico inicial de "esquizofrenia" e o diagnóstico final de simples "mal da alma", para o qual o diálogo persistente e a insistência do psicanalista se revelam fundamentais.
Percorrendo os lugares conhecidos da psicanálise, Devereux consegue chegar à verdade íntima da mente e do corpo do seu paciente e desse modo libertá-lo para o futuro. E desse diálogo axial nada, nem a presença de passagem de Madeleine/Gina McKee, uma mulher na vida do psicanalista para contrabalançar as diversas de Jimmy, nos distrai, o que provoca uma absoluta concentração do filme na sua questão nuclear, sem paliativos ou concessões, mas explorando-a em todas as suas ramificações dramáticas presentes, passadas e oníricas.
Para o comum dos espectadores de cinema este é um filme altamente recomendável pelo duelo entre dois grandes actores, Benicio Del Toro e Mathieu Amalric, o que é manifesto, evidente. Para mim, além disso e integrando-o este é um novo grande filme, elipticamente construído sobre os espaços, os tempos e os diálogos, de um grande cineasta, Arnaud Desplechin, para cujo nome me permito chamar aqui de novo a atenção.
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