No
início de "Night Moves", de Kelly Reichardt (2013), Dena/Dakota Fanning
diz ser favorável, na luta pela protecção do ambiente, às "pequenas
acções", como tal dando a entender que considera como tal o acto que
ela, Josh/Jesse Eisenberg e Harmon/Peter Sarsgaard preparam e levam a
cabo na primeira parte do filme.
Nessa primeira hora a minuciosa descrição do filme dá a impressão de
que se está perante uma acção inofensiva, quase uma brincadeira entre
amigos.
Sem privilegiar nenhum dos três embora mostrando já um potencial de
simpatia por Josh, Kelly Reichardt consegue dar como banalidade
quotidiana o que então se passa entre eles de forma que pelo menos não
os hostiliza.
Quando, na segunda parte do filme, se sabe que a sua acção fez uma vítima, mesmo se involuntária, já assumindo a perspectiva de Josh as coisas tornam-se negras para o trio, de tal modo que se percebe que alguém ali vai ceder e alguém ali vai ter de agir. A passagem para o ponto de vista de Josh mostra-se inteiramente justa, os magníficos exteriores da primeira parte desaparecem para dar lugar a interiores ou localidades precisas e o filme acelera na sua meia-hora final, em especial a partir do momento em que, sem que seja mostrado, sabemos que Josh se introduziu de noite em casa de Dena.
A arte de Kelly Reichardt emerge aqui de uma forma nova, inesperada, e a conclusão é excelente porque mantém o terror de Josh. Não lhe quero chamar apenas subtileza, mas presciência. Com actores certos, em especial Jesse Eisenberg num papel bressoniano, "Night Moves" move-se insensivelmente de uma descrição monótona, embora atenta a uma natureza sensível, para uma tensão subrepticiamente surgida, muito bem desenvolvida e dominada.
Eu que tenho em especial apreço esta cineasta (ver "Perdidos", 5 de Julho de 2012) confesso-me rendido a este filme quje me faz acreditar mais que o melhor do cinema americano está, neste momento, a passar pelo seu novíssimo cinema independente, de que Kelly Reichardt faz parte. O espantoso equilíbrio criado entre a suas duas partes, as subdivisões da segunda, o tom geral que exclui qualquer tipo de julgamento em favor do dar a ver, mostrar, dão conta de um trabalho de realização mais que seguro, complexo e generoso, em que a cineasta reafirma a sua integridade como autora.
Se fosse preciso, escolheria a sequência acima mencionada entre Josh e Dena como um dos melhores momentos de cinema a que me foi dado assistir este ano, até porque ela culmina uma linha de tensão crescente sem fechar o filme, pois segue-se-lhe Josh acossado com que ele termina.
Porque não acredito em coincidencias, chamo a atenção para que o título original deste filme, "Night Moves", recupera o de "Um Lance no Escuro" (1975) do honrado Arthur Penn (1922-2010). E não devo deixar de referir que Jonathan Raymond volta a estar ao lado da cineasta no argumento, a própria realizadora responde pela montagem e o nome de Todd Haynes surge como produtor executivo.
Escrevi acima que Josh é uma personagem bressoniana. Acrescento agora que este é o mais bressoniano filme de que o cinema americano, que já teve Paul Schrader, hoje em dia (honra a Kelly Reichardt) é capaz. Notável.
Quando, na segunda parte do filme, se sabe que a sua acção fez uma vítima, mesmo se involuntária, já assumindo a perspectiva de Josh as coisas tornam-se negras para o trio, de tal modo que se percebe que alguém ali vai ceder e alguém ali vai ter de agir. A passagem para o ponto de vista de Josh mostra-se inteiramente justa, os magníficos exteriores da primeira parte desaparecem para dar lugar a interiores ou localidades precisas e o filme acelera na sua meia-hora final, em especial a partir do momento em que, sem que seja mostrado, sabemos que Josh se introduziu de noite em casa de Dena.
A arte de Kelly Reichardt emerge aqui de uma forma nova, inesperada, e a conclusão é excelente porque mantém o terror de Josh. Não lhe quero chamar apenas subtileza, mas presciência. Com actores certos, em especial Jesse Eisenberg num papel bressoniano, "Night Moves" move-se insensivelmente de uma descrição monótona, embora atenta a uma natureza sensível, para uma tensão subrepticiamente surgida, muito bem desenvolvida e dominada.
Eu que tenho em especial apreço esta cineasta (ver "Perdidos", 5 de Julho de 2012) confesso-me rendido a este filme quje me faz acreditar mais que o melhor do cinema americano está, neste momento, a passar pelo seu novíssimo cinema independente, de que Kelly Reichardt faz parte. O espantoso equilíbrio criado entre a suas duas partes, as subdivisões da segunda, o tom geral que exclui qualquer tipo de julgamento em favor do dar a ver, mostrar, dão conta de um trabalho de realização mais que seguro, complexo e generoso, em que a cineasta reafirma a sua integridade como autora.
Se fosse preciso, escolheria a sequência acima mencionada entre Josh e Dena como um dos melhores momentos de cinema a que me foi dado assistir este ano, até porque ela culmina uma linha de tensão crescente sem fechar o filme, pois segue-se-lhe Josh acossado com que ele termina.
Porque não acredito em coincidencias, chamo a atenção para que o título original deste filme, "Night Moves", recupera o de "Um Lance no Escuro" (1975) do honrado Arthur Penn (1922-2010). E não devo deixar de referir que Jonathan Raymond volta a estar ao lado da cineasta no argumento, a própria realizadora responde pela montagem e o nome de Todd Haynes surge como produtor executivo.
Escrevi acima que Josh é uma personagem bressoniana. Acrescento agora que este é o mais bressoniano filme de que o cinema americano, que já teve Paul Schrader, hoje em dia (honra a Kelly Reichardt) é capaz. Notável.
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