“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

domingo, 24 de julho de 2016

Entre inocência e malícia

    "Maravilhoso Boccaccio"/"Maraviglioso Boccaccio", de Paolo e Vittorio Taviani (2015), tem uma inspiração feliz e uma realização superior a partir de argumento dos dois irmãos baseado no "Decameron" do famoso escritor renascentista.
                    
     O filme adopta um dispositivo narrativo simples a partir de um grupo de rapazes e raparigas que contam cada um uma história de amor, num total de cinco, no final do Século XIV, durante os anos de peste negra em Florença. Cada história resume-se a um pequeno racconto com possível proveito e exemplo, entre a inocência do primeiro, o humor do segundo, a crueldade do terceiro, a malícia do quarto e a ironia do quinto.
     Tudo se resume a muito pouco mas o mérito deste filme reside na subtileza das narrativas e na harmonia da realização que as liga umas às outras com clara consistência e inteiro espírito crítico. Então o Renascimento italiano apenas se iniciava e estavam ainda muito presentes elementos medievais, o que "Maravilhoso Boccaccio" com argúcia capta muito bem.
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     A época está irrepreensivelmente reconstituída tanto em cenários como em guarda-roupa para filmagens que decorreram na Toscana, e os actores prestam-se de bom-grado e com à-vontade ao que lhes é pedido. Desta forma, com vestuário de Lina Nerli Taviani, fotografia de Simone Zampagni, música de Giuliano Taviani e Carmelo Travia e montagem de Roberto Perpignani, "Maravilhoso Boccaccio" culmina uma das obras mais interessantes do cinema italiano dos últimos 50 anos.
     O seu sentido na obra dos irmãos Taviani poderá ser encontrado ligando-o a filmes de carácter histórico dos anos 70, como "São Miguel Tinha Um Galo"/"San Michele aveva un gallo" (1972) e "Que Viva a Revolução"/"Allonsanfàn" (1974), e até sobretudo com "Kaos" (1984), em que trabalharam sobre cinco histórias de Luigi Pirandello, "Afinidades Electivas"/"Le affinità elettive" (1996), em que adaptaram Goethe, e o próprio "César Deve Morrer"/"Cesare deve morire" (2012), o seu filme anterior, o que o torna menos inesperado do que pode parecer a alguns.
     Sobre Paolo e Vittorio Taviani ver "Jogo de espelhos", de 15 de Novembro de 2012.

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