“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

domingo, 31 de julho de 2016

Proeza nas ruas de Berlim

     Chamei um destes dias de passagem "pirueta técnica" ao plano-sequência único em que é construído "A Arca Russa", de Alexander Sokurov, e devo aqui corrigir, pois trata-se de uma verdadeira "proeza técnica" com evidentes implicações fílmicas e estéticas. Ora a proeza de Sokurov, em interiores, é agora repetida pelo alemão Sebastian Schipper em "Victoria" (2015), um filme todo ele filmado em cenários reais e em exteriores num plano-sequência único e em tempo real.            
                       Berlin’s Two Hour Single Take Action Film ‘Victoria’ Trailer
     Nas ruas de Berlim um grupo de quatro amigos encontra uma espanhola, uma madrilena, a personagem cujo nome dá o título ao filme e que é interpretada por Laia Costa. Um deles, Sonne/Frederick Lau, enamora-se dela, enquanto a outro, Boxer/Franz Rogowski, é encomendado um assalto a um banco para pagar protecção concedida na prisão. Victoria toma o lugar do condutor e depois não vos conto a história.
     Todos eles são jovens e as personagens masculinas, berlinenses puros, conhecem-se entre si desde sempre, enquanto ela alinha porque lhe dizem ser um trabalho "sem problemas".
                       Victoria is in cinemas from the 1st April - HeadStuff.org
    Com boa caracterização das personagens e excelentes interpretações, o filme, que conta com argumento do próprio realizador com Olivia Neergaard-Holm e Eike Frederik Schulz, fica nas mãos do director de fotografia Sturla Brandth Grovlen e do seu espantoso trabalho em plano-sequência único.
    A outra grande diferença em relação ao filme de Sokurov é estarmos aqui perante um puro filme de ficção, um filme de acção em que as personagens se movem a grande velocidade, o que torna mais difícil segui-las num único plano sequência, embora a câmara de filmar esteja sempre no lugar certo, definindo o ponto de vista justo.
                       Cinematographer Sturla Brandth Grøvlen and director Sebastian Schipper.
    Há em todo este filme uma muito clara vontade de fazer bem e novo uma obra de género - trata-se de um típico filme negro -, que talvez sem a proeza técnica em causa não desse especialmente nas vistas. Filmado em continuidade entre a noite e a madrugada, "Victoria" de Sebastian Schipper apresenta-se como um filme notável pela sua ousadia e pelo seu acerto, embora a música de Nils Frahm seja por vezes um tanto redundante.
    Pelo seu brio cinematográfico nada me espanta que tenha ganho a maioria dos prémios do cinema alemão. Este é um filme que aconselho sem reservas e que marca este Verão no circuito comercial português.      

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