A terceira longa-metragem de Ruben Fleischer, "Força Anti-Crime"/"Gangster Squad" (2013), é o primeiro filme dele que vejo e revela-se muito interessante por proceder a uma recuperação muito curiosa do filme negro da Série B do pós-guerra, época em que, aliás, a sua acção se situa. A minha curiosidade tinha sido suscitada por ser anunciado que se baseia em factos reais e a expectativa não foi defraudada.
Com argumento de Will Beall baseado no livro de Paul Lieberman, o filme assume uma narrativa clara na Califórnia do pós-guerra, em que uma força especial da polícia de Los Angeles assume o objectivo de dar caça a um conhecido e tolerado gangster local, Mickey Cohen/Sean Penn. Sem assumir uma posição nem explicitamente moralizante nem actual, "Força Anti-Crime" inscreve no seu programa narrativo e estético ser um filme de acção em que tudo é claro e está no seu lugar entre um gang criminal e a polícia, incapaz de pelos meios comuns chegar apanhá-lo e prendê-lo.
Simplesmente, o estilo da acção e a estética do filme, clara e contrastada uma como a outra, apontam para uma recuperação de meios e métodos narrativos da Série B que, nomeadamente no filme policial e no filme negro, tão boa conta de si deu no pós-guerra. Nessa conformidade, não interessa a "Força Anti-Crime" a especificidade ou a complexidade psicológica própria das personagens mas a clareza, até a simplicidade, do esquema narrativo em que estão envolvidas e o papel que nele desmpenham. Assim, as personagens são inteiramente tipificadas, como eram na Série B e sobre o modelo desta, e portanto como tal reconhecíveis numa América que emergira da Guerra Mundial, em que triunfara, com uma acentuada crise de confiança interna, em si própria.
Trata-se, pura e simplesmente, de constituir o grupo que, como tal (como gang) se vai encarregar de tentar apanhar o conhecido gangster, que se escapa aos métodos de investigação convencionais devido às cumplicidades estabelecidas dentro do próprio sistema. Temos, assim, o polícia casado, aquele que se apaixona por uma ruiva que está sob as ordens de Mickey Cohen (o Rato Mickey, como a certa altura lhe chamam), o polícia negro, o atirador, o especialista de escutas e até um voluntário desconhecido, que todos juntos vão descrever o percurso que vai conduzir ao objectivo em vista.
Só que o filme assume, da realização à caracterização das personagens, dos cenários à montagem, a revisitação de uma época precisa, em termos de tal modo fiéis e convincentes que a própria interpretação dos actores e actrizes aponta para uma tipificação irredutível, que convoca o distanciamento ao mesmo tempo que remete para os clássicos da Série B, como Anthony Mann nos anos 40, Sam Fuller ou Don Siegel nos anos 50 e 60. E "Força Anti-Crime" tem mesmo um certo tom gratificante, na medida em que os maus são punidos - Cohen é preso em circunstâncias muito originais -, num filme que não pretende mais do que assumir-se como típico filme de época e de género.
As cenas de acção são muitas e muito boas (O'Mara chega a perguntar se não existirá identidade entre o seu grupo e aquele que persegue...), os actores estão todos no registo certo, a própria fotografia, de Dion Beebe, embora sem enjeitar a cor tem momentos em que joga sobre a quebra de contrastes enquanto noutros os acentua, como num filme a preto e branco, a música de Steve Jablonsky assume, ela também, tons de época. E é gratificante assistir ao regresso de Nick Nolte, como Chief Parker, ao lado de grandes nomes mais novos: Josh Brolin como John O'Mara, Ryan Gosling como Jerry Wooters e o próprio Sean Penn, um actor que hoje em dia é capaz de interpretar qualquer personagem ao melhor nível, num filme que também ironiza sobre Hollywood com toda a pertinência. E o genérico final é muito bom, participando do tom revivalista do filme.
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