“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

domingo, 6 de outubro de 2013

Um longo caminho

    O alemão Thomas Arslan, trabalhando como sempre sobre um argumento original da sua autoria, dirigiu "Ouro"/"Gold" (2013), filme que decorre no final do Século XIX no Canadá e com o qual recupera a memória do western de uma maneira feliz e moderna.
    Sem se socorrer de todo o aparato do género, antes trabalhando sobre dados simples e elementos minimalista, o cineasta constrói o seu filme sobre um grupo de alemães que empreende um longo percurso na Columbia Britânica para chegar à mítica Dawson, onde se diz ter sido descoberto ouro. Depois de uma abertura belíssima, o desenvolvimento temático é muito interessante, sobretudo a partir do momento em que, pelas mais diferentes razões, começam as defecções no grupo.    
                    Gold : Photo Nina Hoss  
      Assim, onde se poderia esperar uma contenda interna entre rivais pelo mesmo objectivo, ou até pela mesma mulher, Emily Meyer/Nina Hoss, assiste-se a um progressivo emagrecimento do grupo, já de si reduzido, até só ficarem ela e o carregador, Carl Böhmer/Marko Mandic. Mas cada personagem tem vida e identidade própria, não se limitando a encarnar uma ideia, o que torna o filme especialmente interessante e atraente.
                    Gold
     Na magnífica paisagem da Columbia Britânica, onde foi rodado, não temos, pois, neste filme as manifestações de ganância que o ouro frequentemente suscita, antes um grupo de gente que o persegue e cujos membros, um a um, vão ficando pelo caminho, como que no cumprimento de um destino funesto que a música de Dylan Carlson, original e muito presente, comenta como um coro. Em "Ouro" temos momentos de grande tensão, como a ameaça de enforcamento sumário do chefe da expedição, Wilhelm Laser/Peter Kurth, a amputação e posterior morte de Gustav Müller/Uwe Bohm, o enlouquecimento e a desaparição de Joseph Rossmann/Lars Rudolf, cada um dos quais ficáramos a conhecer bem.
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     Não vos conto o final, que é muito bom e contribui decisivamente para fazer deste filme um típico filme pós-moderno sobre um assunto clássico. Sem sobressaltos, formais ou outros, "Ouro" decide-se entre uma serenidade formal e uma tensão dramática que apenas a música vem comentar, passa num sopro mas fica connosco, confirmando Thomas Arslan como mais um nome de relevo a reter num novo "cinema novo" alemão (ver "O encenador", 21 de Setembro de 2012). A este tipo de "regresso do western" (ver também "Perdidos", 5 de Julho de 2012) eu sou muito receptivo.

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