Um ano depois de "Procurem Abrigo"/"Take Shelter" (ver "A tempestade, 24 de Maio de 2012), Jeff Nichols dirigiu a sua terceira longa-metragem, "Fuga"/"Mud" (2012), que agora estreou entre nós. Trata-se de um filme muito diferente dos seus filmes precedentes, salvo no final mais distendido e sereno, que encena um imaginário adolescente como fábula verista.
Passado de novo no mítico sul dos Estados Unidos, no Arkansas, este filme materializa numa personagem em fuga, solitária e precisando de ajuda, Mud/Matthew McConaughey, os afectos, as carências e os sonhos de dois adolescentes de 14 anos, Ellis/Tye Sheridan e Neckbone/Jacob Lofland. No desconhecido ambos concentram um imaginário que procura um futuro exaltante e romântico como catalisador de um presente banal, embora com os seus problemas - os pais de Ellis vão separar-se e a "namorada" dele, May Pearl/Bonnie Sturdivant, complica-lhe especialmente a vida, enquanto Neck vive com um tio, Galen/Michael Shannon.
O fascínio romântico de Mud resulta de ele lhes dizer querer fugir, no barco que lhes pede o ajudem a recuperar numa ilha no Rio Mississippi, onde eles o descobriram, com a sua namorada, Juniper/Reese Witherspoon, a qual, por sua vez, é utilizada por aqueles que querem matar Mud para tentarem encontrá-lo. Uma segunda figura misteriosa, Tom/Sam Shepard, vem duplicar a figura misteriosa de Mud para o proteger no final.
Grande parte do interesse deste filme advém do tratamento do espaço na horizontal, a partir de figuras humanas centradas ou descentradas, em termos filmicamente muito interessantes que permanentemente rasgam horizontes ao mesmo tempo que encerram as personagens em espaços fechados - a ilha, as casas, o motel. Com um conseguido balancear entre exteriores e interiores, "Fuga" adquire um novo fôlego e um novo rumo primeiro com a revelação dos perseguidores do protagonista, depois com a ausência de Juniper do local onde Ellis ficara de a recolher para se juntar ao namorado.
Mas a arte de Jeff Nichols, como sempre também autor do argumento, revela-se especialmente na manutenção da intriga e do filme entre um registo realista e um registo de fábula, o que permite construir o seu mistério e resolvê-lo em (e entre) ambos os registos. Aliás, e como se compreende, por aqui passa a memória dos romances de iniciação de Mark Twain (ver "A vida é assim", 20 de Abril de 2013), num filme em que o cineasta reafirma, quer visualmente, quer pelo uso parcimonioso da música, que ocupa um lugar de relevo, indispensável, no panorama do novo cinema independente americano.
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