A terceira longa-metragem de Catarina Ruivo, "Em Segunda Mão" (2012), é um filme curioso e bem construído, cuja parte visual excede mesmo a proposta narrativa enigmática que apresenta. "Eu é um outro" adquire aqui um sentido curioso e bem imaginado, embora elementar e sem pretender deixar de o ser.
Um escritor de romances eróticos - havia uma personagem semelhante em "Um Adeus português", de João Botelho (1986) - que por curiosidade se deixa envolver numa relação com uma mulher cujo primeiro marido desaparecera, não pode senão chegar ao cansaço dessa relação e das obrigações que ela implica e à procura desse misterioso marido, desaparecido depois de um acidente, para chegar à conclusão de que este tomara o seu lugar de escritor popular, que ele entretanto abandonara.
De uma grande sobriedade, o filme tem momentos lentos e de espera mas tem também planos de muito feliz construção visual, com a curiosidade de a música que apresenta ser apenas a diegética. Sem pretender jogar na tensão dramática, "Em Segunda Mão" vai-se construindo aos poucos, para gradualmente expor o que tem a dizer sobre aquelas personagens e a situação que vivem, e acabar por resolver-se com alguma surpresa preparada e lógica excessiva no final.
Depois desse final da descoberta da troca de lugares, há um plano longo em que Jorge/Pedro Hestnes contempla do exterior a mulher que acaba de deixar, Laura/Rita Durão, e a respectiva criança, André/Vasco Apolinário. Depois desse plano, o último, em que Jorge corre à chuva na direcção da câmara.
Sendo um filme pessoal e bem construído, mesmo o seu melhor até agora na sua sobriedade contida e muito bem dominada, este não é ainda o grande filme que Catarina Ruivo desde "André Valente" (2004) promete, mas permite manter intacta a confiança que desde aí nela se deposita. (Há ainda problemas de som, com a pós-sincronização, que prejudicam e que a realizadora pode superar no futuro.)
A correr à chuva se despediu do cinema Pedro Hestnes (1962-2011), um grande actor que sempre soube imprimir o seu génio pessoal a tudo o que fez no cinema, como aqui, contracenando com Luís Miguel Cintra, de novo acontece, e de quem este foi o último filme.
A correr à chuva se despediu do cinema Pedro Hestnes (1962-2011), um grande actor que sempre soube imprimir o seu génio pessoal a tudo o que fez no cinema, como aqui, contracenando com Luís Miguel Cintra, de novo acontece, e de quem este foi o último filme.
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