António-Pedro Vasconcelos é um dos cineastas saídos do Novo Cinema Português dos anos 60/70. Com uma obra não muito extensa atrás de si, o seu último filme, "Os Gatos não Têm Vertigens" (2014), vem confirmá-lo como um cineasta do "lugar-comum", que ele não deixou de ser mesmo nos seus melhores filmes: "O Lugar do Morto" (1984), "Aqui D'El Rey" (1992), "Os Imortais" (2003).
Não se veja nisto um juízo de minimização, antes o reconhecimento de que ele trabalha onde, em princípio, por uma ou outra razão, todos nos reconhecemos. Grandes cineastas de todo mundo trabalharam antes dele, ao mesmo tempo que ele e depois dele, o "lugar- comum". Em termos formais, o seu último filme tem mesmo características de melodrama com traços de telenovela, o que uma filmagem seca implica e uma música omnipresente (Luís Cília) secunda.
Com argumento de Tiago Santos, a narrativa tem todos os lugares-comuns da actualidade portuguesa, do casal de opositores ao antigo regime aos jovens marginais deixados entregues a si próprios. Mas, como vem fazendo desde "Call Girl" (2007) em especial, António-Pedro Vasconcelos radicaliza os contrastes, neste caso entre uma mulher de 73 anos, Rosa/Maria do Céu Guerra, cujo marido, Joaquim/Nicolau Breyner, a deixou de vez em pleno baile com sapatos de Fred Astaire, e um jovem de 18 anos, Jô/João Jesus, que, abandonado pelos pais, anda em más companhias.
Aí surgem então todos os lugares-comuns possíveis e imagináveis, de filhos ingratos e oportunistas a pais tiranos e oportunistas, do fantasma de um morto a uma antiga resistente anti-fascista que bebe vinho tinto e amigos da má-vida que não são maus rapazes. Nos próprios diálogos prolifera o lugar-comum de meias palavras. Só que, inequívoco, um subtexto percorre o filme: a crise em que o país vive mergulhado há vários anos, objecto de alusões de diversas personagens, mesmo se de passagem - esse faliu, serei eu a seguir? Ora é a esse nível que "Os Gatos não Têm Vertigens" se constrói como filme político.
Gosto especialmente do início e do final (já em "A Bela e o Paparazzo", uma comédia de 2010, apreciara sobretudo o final, inspirado na comédia americana clássica), mas é o estado de espírito reinante entre as personagens, acabrunhado e desanimado sem perder o sorriso, de continuar a manifestar-se porque não há outra coisa a fazer para que as coisas melhorem - a mensagem passada por Rosa a Jô numa passagem de testemunho a vários níveis -, que se impõe. Demasiado moralista e optimista como lugar-comum, que o fado cantado por Ana Moura no final esclarece e comenta, este um filme perfeitamente à altura de António-Pedro como "cineasta pessimista".
Se há na actualidade um clássico em plena actividade no cinema português é ele, e é bom vê-lo aqui num pequeno mas significativo papel (ver a seu respeito "Leos Carax: as versões", de 18 de Fevereiro de 2012).
Nota: Cf., de António Pedro Vasconcelos, "O Futuro da Ficção" (Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2012).
Se há na actualidade um clássico em plena actividade no cinema português é ele, e é bom vê-lo aqui num pequeno mas significativo papel (ver a seu respeito "Leos Carax: as versões", de 18 de Fevereiro de 2012).
Nota: Cf., de António Pedro Vasconcelos, "O Futuro da Ficção" (Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2012).
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