Iniciou-se este fim de semana no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian a importante programação "Harvard na Gulbenkian - Diálogos sobre o cinema português e o cinema do mundo" que, com curadoria de Haden Guest e Joaquim Sapinho, vai apresentar nos próximos meses, para já até Março de 2014 com a secção "Depois de Vanda", um conjunto de obras muito importantes do cinema contemporâneo.
Arrancando com o mítico "Trás-os-Montes", de António Reis e Margarida Cordeiro (1976), e com a previsão de algumas sessões surpresa, este ciclo é tanto mais importante quanto cada sessão é seguida de debate com nomes de referência do cinema actual, entre os quais realizadores como o húngaro Béla Tarr, o brasileiro Nelson Pereira dos Santos, o chileno Patricio Guzmán, a sul-coreana Soon-Mi Yoo, os portugueses Susana Sousa Dias e Manuel Mozos, a argentina Lucrecia Martel, o canadiano Denis Côté e o espanhol Albert Serra, que apresentam e debatem os seus filmes e filmes de outros - por exemplo, "Mudar de Vida", de Paulo Rocha (1966), já em Dezembro.
Numa altura em que em Lisboa continuam a fechar salas de cinema, um sintoma sempre preocupante da degradação de um estado de coisas, esta é uma iniciativa muito importante por mostrar filmes muito bons, alguns dos quais desconhecidos ou raramente vistos na actualidade, e por, além de pôr os filmes a falar por si próprios, pôr os cineastas e outros convidados - entre os quais Dennis Lim, crítico do New York Times - a falar também sobre os filmes.
Pouco habituados já a este tipo de tratamento do cinema, salvo na Cinemateca Portuguesa e nos diferentes festivais de cinema, pela sua programação e intenção esta nova iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian vem repor o cinema no seu justo lugar para todos os verdadeiros interessados, num grau de qualidade e exigência de saudar. Será muito importante assistir e participar.
Por mim, tive ontem, Sábado a revelação de Ben Rivers, autor de cinema esperimental de quem me impressionou sobretudo "Two Years at See" (2011), um filme a preto e branco, com grão visível, que segue um homem solitário (com um gato) em interiores e na natureza, e atinge a surpresa e o fascínio quando o apanha na água, primeiro em movimento e sobretudo quando pára, momento mágico em que o tempo se detém enquanto o tosca embarcação deriva para a direita, até ao extremo da imagem, quando ele retoma o remos e inverte o movimento. Com um sábio aproveitamento do fora de campo, nomeadamente dos ruídos, este filme volta a surpreender no seu final, com um plano longo do rosto da personagem do lado direito, iluminado apenas pelas chamas fora de campo de uma fogueira. Mas, além disso, "Two Years at See" tem um excelente tratamento dos espaços vazios e dos detritos, sobre os quais se constrói e constrói a sua personagem abandonada.
Precisamos todos de assistir a estes filmes e de participar nestes debates. A seguir atentamente.
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