José Tolentino Mendonça é um dos grandes poetas portugueses da actualidade, com vários livros publicados também em prosa. Conheço melhor a sua obra poética, que aprecio. Publicou agora "A Papoila e o Monge" (Lisboa, Assírio & Alvim, 2013), livro em que dá conta de uma extrema depuração da sua linguagem poética, reduzida à expressão do haiku.
Esta "redução" significa, de facto, a demonstração de um pleno domínio da linguagem poética e, consequentemente, a passagem para um grau diferente de expressão poética, o que, tratando-se de alguém com muito boas provas dadas em poesia, aqui devo assinalar.
Mas simultaneamente o seu nome surge associado ao último livro de fotografia de Duarte Belo, um dos maiores fotógrafo portugueses de exterior, de fotografia documental da actualidade. Trata-se de "Os rostos de Jesus - Uma revelação" (Lisboa, Temas & Debates/Círculo de Leitores, 2013), em que o conhecido fotógrafo se dedica a fotografar exaustivamente as figuras de Cristo abundantemente representadas em esculturas em altos de Cruzeiro ao longo de Portugal, sobretudo no Norte do país e com especial concentração no Alto Minho.
Não surpreende que a este projecto aparentemente insensato (107 fotografias a cores, a diferentes distâncias e com diferentes ângulos) surja associado o nome do autor de "A construção de Jesus" (Lisboa, Assírio & Alvim, 2004), que no estudo "Hipóteses para um rosto" - que replica o de Duarte Belo, "A escultura de uma fotografia", revelador de grande auto-consciência do seu trabalho e do contexto em que ele se insere -, com pertinência e argúcia trata da questão das representações de Jesus Cristo.
Questão muito interessante também no cinema, sobretudo a partir da reflexão fundamental de André Bazin que inclui o Santo Sudário de Turim no seu fundamental "Ontologia da Imagem Fotográfica"/"Onthologie de l'image photographique" (1945) - uma abordagem a que recentemente noutra perspectiva Georges Didi-Huberman regressou mais desenvolvidamente em "La ressemblance par contact" (Paris, Les Éditions de Minut, 2008) -, a representação de Cristo apresenta um vasto historial em História da Arte, a que as fotografias deste excelente livro, o ensaio de Duarte Belo e o bem informado estudo de Tolentino Mendonça se vêm agora acrescentar.
Como esta é uma questão ainda hoje muito interessante, que me leva a chamar a atenção também para este segundo livro, permito-me, com a devida vénia, juntar aqui mais três rostos de Cristo no cinema: o de "Acto da Primavera", de Manoel de Oliveira (1963), o de "O Evangelho Segundo São Mateus"/"Il vangilo secondo Matteo", de Pier Paolo Pasolini (1964), e o de "A Última Tentação de Cristo"/"The Last Temptation of Christ", de Martin Scorsese (1988), três grandes filmes de três grandes cineastas. Há outras figurações crísticas no cinema? Evidentemente que sim, mas na sua modernidade para estas três chamo neste momento especial atenção: o popular de Oliveira, o estilizado de Pasolini, o torturado de Scorsese.
Como esta é uma questão ainda hoje muito interessante, que me leva a chamar a atenção também para este segundo livro, permito-me, com a devida vénia, juntar aqui mais três rostos de Cristo no cinema: o de "Acto da Primavera", de Manoel de Oliveira (1963), o de "O Evangelho Segundo São Mateus"/"Il vangilo secondo Matteo", de Pier Paolo Pasolini (1964), e o de "A Última Tentação de Cristo"/"The Last Temptation of Christ", de Martin Scorsese (1988), três grandes filmes de três grandes cineastas. Há outras figurações crísticas no cinema? Evidentemente que sim, mas na sua modernidade para estas três chamo neste momento especial atenção: o popular de Oliveira, o estilizado de Pasolini, o torturado de Scorsese.
Por mim, olhem para onde quiserem, mas, mesmo se de passagem, não deixem de olhar também para aqui. E, uma vez que deles falo, quando puderem vejam esses filmes - e também o didáctico "Il Messia", de Roberto Rossellini (1975), hoje em dia muito difícil de encontrar - que "tateiam" mais do que um rosto na mesma perspectiva fragmentária e inominável. A questão da representação/figuração pode, apesar de tudo, surgir de modo diferente no cinema por ele, contrariamente à escultura e à fotografia, ser imagem em movimento, especialmente quando a querela iconoclastas-iconólatras, de que dão conta detalhadamente Martine Joly ("A Imagem e os Signos"/"L'image et les Signes", 2000 - edição portuguesa Edições 70, Lisboa, 2005) e Hans Belting ("A Verdadeira Imagem"/"Das echte Bild. Bildfragen", 2006 - edição portuguesa Dafne Editora, Porto, 2011), nos surge como um desatino de um tempo que hoje temos tanta dificuldade em entender como necessidade de compreender. "Vive como quem constrói uma imagem/uma imagem/que desaparece" (José Tolentino Mendonça).
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