O mais recente filme de Jia Zhang-ke a estrear em Portugal, "China - Um Toque de Pecado"/"Tian zhu ding" (2012), é mais uma obra extraordinária do grande cineasta chinês da actualidade. Extraordinária e inesperada, pois aqui ele enfrenta a violência no seu país.
Em quatro episódios diferentes, diferentes personagens assistem ao advir da violência em si próprias, cada uma pelas suas próprias e pessoais razões, que somos convidados a compreender - mais uma vez, com o cineasta o convite é para compreendermos o que nos apresenta, por mais estranho, insólito que possa parecer. O percurso de Jia Zhang-ke continua a revelar-se exemplar na escolha dos aspectos mais sensíveis, mais difíceis de abordar da sua sociedade, que são aqueles que manifestamente mais o atraem, o interessam.
Naquele homem revoltado com a vulnerabilidade do poder que o rodeia, no jovem que convive mal com a sua própria família, na mulher que se surpreende vítima dos que a rodeiam depois da morte do homem que ama, no jovem que não encontra outra saída que no salto no vazio reencontramos a sociedade chinesa mas também as sociedades em que vivemos, e reconhecemo-nos na sua comum humanidade. Não se trata para Jia de julgar as suas personagens nem de convidar-nos a julgá-las, mas de mostrar vidas difíceis mas banais em toda a sua crueza.
Tendo já tratado aqui de filmes do cineasta chinês (ver"Contra o esquecimento", 29 de Janeiro de 2012), não devo esconder o grande apreço em que tenho a sua obra, intransigente e de uma grande coerência ética e estética, o que o torna um dos grandes cineastas da actualidade a nível mundial. Em "China - Um toque de pecado" ele persegue e prossegue o melhor da sua inpiração fílmica, como quem persegue o desvendar de um sonho que está na própria realidade.
Mais móvel e livre, sem esquecer as temáticas (os "pobres diabos" entregues a si próprios) e as figuras de estilo (o plano longo com profundidade de campo, o teatro, os ecrãs) que o notabilizaram mas sem se deixar entravar por elas, Jia Zhang-ke não esconde a simpatia que sente pelas suas personagens, eivada de compreensão e compaixão, que o final sintetiza. Com actores sempre admiráveis, com destaque para Wu Jiang como Dahai e e Tao Zhao como Xiao Yu, o cineasta volta a encontrar o director de fotografia Yu Lik Wai e o compositor Lim Giong, com os quais, manifestamente, continua a dar-se muito bem para encontrar o seu tom pessoal, em que a continuidade do plano é comum e a música usada com parcimónia.
Mas é de novo no encontrar o universal no local que reside a grandeza deste novo filme do cineasta chinês. Ao perseguir o devir-violento da impotência no primeiro episódio, a violência que resulta da desorientação no segundo, a que se mostra como a solução na falta de outras nos dois últimos ele toca os pontos sensíveis onde eles são gerais.
Claro que o filme também trata da corrupção na China, em especial no seu primeiro episódio, e talvez por isso se torne mais notado, mas mesmo aí trata-se de uma situação local bem observada mas de ressonância universal nos nossos dias.
Pois é assim mesmo: entre Jia Zhang-ke, Abbas Kiarostami e alguns (poucos) outros se joga o melhor do cinema actual - estou lamentavelmente sem notícias do japonês Takeshi Kitano, cujo Office Kitano se encontra, contudo, por trás dos últimos filmes deles. O resto, salvaguardados eventuais novos cinemas novos, limita-se de modo geral a alimentar a competição, a publicidade e a conversa, a manter a tradição e tentar salvar o prestígio de uma arte que já conheceu melhores dias.
Mais móvel e livre, sem esquecer as temáticas (os "pobres diabos" entregues a si próprios) e as figuras de estilo (o plano longo com profundidade de campo, o teatro, os ecrãs) que o notabilizaram mas sem se deixar entravar por elas, Jia Zhang-ke não esconde a simpatia que sente pelas suas personagens, eivada de compreensão e compaixão, que o final sintetiza. Com actores sempre admiráveis, com destaque para Wu Jiang como Dahai e e Tao Zhao como Xiao Yu, o cineasta volta a encontrar o director de fotografia Yu Lik Wai e o compositor Lim Giong, com os quais, manifestamente, continua a dar-se muito bem para encontrar o seu tom pessoal, em que a continuidade do plano é comum e a música usada com parcimónia.
Mas é de novo no encontrar o universal no local que reside a grandeza deste novo filme do cineasta chinês. Ao perseguir o devir-violento da impotência no primeiro episódio, a violência que resulta da desorientação no segundo, a que se mostra como a solução na falta de outras nos dois últimos ele toca os pontos sensíveis onde eles são gerais.
Claro que o filme também trata da corrupção na China, em especial no seu primeiro episódio, e talvez por isso se torne mais notado, mas mesmo aí trata-se de uma situação local bem observada mas de ressonância universal nos nossos dias.
Pois é assim mesmo: entre Jia Zhang-ke, Abbas Kiarostami e alguns (poucos) outros se joga o melhor do cinema actual - estou lamentavelmente sem notícias do japonês Takeshi Kitano, cujo Office Kitano se encontra, contudo, por trás dos últimos filmes deles. O resto, salvaguardados eventuais novos cinemas novos, limita-se de modo geral a alimentar a competição, a publicidade e a conversa, a manter a tradição e tentar salvar o prestígio de uma arte que já conheceu melhores dias.
Sem comentários:
Enviar um comentário