“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Cinco anos depois

     "Carvão Negro, Gelo Fino"/"Bai ri yan huo" (2014), a terceira longa-metragem e o primeiro filme do chinês Diao Yinan a estrear entre nós, deixa muito boa impressão do seu realizador, também autor do argumento original do filme. 
                    
     Poder-se-á começar por identificar neste filme a influência do japonês Takeshi Kitano, uma influência benéfica diga-se desde já. De facto, uma narrativa policial clássica situa-se aqui em volta de um polícia violento, Zhang Zili/Fan Liao, que vai acabar por, cinco anos depois, descobrir o criminoso. 
     De facto, ele é, desde o início, o exemplo acabado daquilo que um polícia, mesmo de uma brigada de investigação criminal, para ser correcto não deve ser, mas vai ser ele quem vai desvendar o intrincado mistério de corpos decepados, de partes de cadáveres dispersas, que cinco anos antes ficara em aberto. Solitário e bruto, brutal até ao crime, Zhang vai descobrir que a pequena mulher inocente, enquanto o seu marido foi responsável pelo outro crime, em carvão e gelo, com lavandaria e casaco estragado de permeio tem, ela também, um mistério oculto no seu próprio passado.  
                     Carvão Negro, Gelo Fino
    Não há sequer facilidade ou condescendência de Diao Yinan em relação ao meio mais pequeno do seu filme, de uma humanidade reconhecível da pista de gelo e do parque de diversões ao salão de baile, passando pela lavandaria, que consegue prender e seduzir apesar do seu carácter narrativamente rebuscado. Em "Carvão Negro, Gelo Fino", com sessão de cinema incluída e tudo estão presentes todos os elementos narrativos e fílmicos que revelam um cineasta original, contra a corrente mainstream do actual cinema chinês, oficial, conformista e bem comportado.
    A influência do cinema de Hong-Kong parece-me mais improvável, enquanto a proximidade com o actual cinema independente chinês me parece mais clara e meritória - a referência a Takeshi Kitano torna-se mesmo explícita no fogo-de-artifício final. Vamos acompanhar este novo e muito prometedor cineasta se nos deixarem, com a ideia de que inocentes nem na China.

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