“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Uma antológica

     Intitula-se "O Peso do Paraíso"/"The Weight of Paradise" a primeira exposição antológica de Rui Chafes, que se encontra no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian até ao dia 18 do próximo mês de Maio e abrange 20 anos da sua criação. Por ela podemos ter uma panorâmica muito significativa da obra de um dos mais importantes artistas portugueses contemporâneos.
    Rui Chafes é um escultor que trabalha com o ferro, e nessa forma de criação a margem deixada ao improviso é, simultaneamente, escassa e maior. Seguindo uma intuição dominada pela consciência do material específico e trabalhoso, as formas que esculpe afastam-se de uma representação simplesmente figurativa, rumo a uma idealizada abstracção de sentido mesmo quando são reconhecíveis.   
      As esculturas desta exposição antológica ocupam o espaço central do CAM mas também o espaço adjacente dos jardins, numa proliferação que muito apropriadamente dá conta da exuberância expansiva do talento do escultor. Além das peças escultóricas, a mostra inclui alguns desenhos, uma instalação sonora, duas fotografias de Paulo Nozolino, um fotógrafo de quem o artista está próximo.  
                                           
     As obras de Chafes dão-nos a noção perfeita de que ele cria alguma coisa a partir do informe, do nada, alguma coisa que fala de si próprio e do mundo à sua volta em termos que sugerem uma empolgante vitalidade rumo a horizontes desconhecidos. A vida tal como criada com o fogo no ferro das esculturas deste artista está simultaneamente contida nas formas de cada peça e no exceder delas que cada uma contém e propõe, ora numa sugestão de multiplicidade de linhas, de formas apontadas ao alto, ora em volumes cheios e curvilíneos, por vezes meras estruturas suspensas apontadas em direcção a nós, ora jogando com o trivial e cortando-nos o caminho, mas sempre suscitando a curiosidade e a atenção do visitante no seu sentido perturbador.            
      Autor de diversos livros em que reflecte sobre a sua arte e as respectivas fontes de inspiração e elabora um pensamento pessoal que permite entendê-lo melhor como escultor culto, com múltiplas mas consistentes influências criadoras, e contribui para fazer dele um artista de culto, Rui Chafes, que é também autor de uma tradução portuguesa dos "Fragmentos", de Novalis (Lisboa, Assírio & Alvim, 1992) e já teve uma exposição em Serralves com Pedro Costa, "Fora!/Out!" (2007), é um artista de referência da arte contemporânea, influenciado pelo minimalismo e pela arte conceptual mas também devedor de Richard Serra e Joseph Beuys, que a todos interessa conhecer. Logo à entrada, "Leçons de Ténèbres" (2006) constitui uma excelente introdução a um universo inquieto, em movimento, pessoal e único, que, eminentemente partilhável, nos desafia, uma introdução muito significativa a uma exposição justamente intitulada "O Peso do Paraíso".

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