O homem que agora nos deixou foi um homem independente, radical e rebelde perante a cultura portuguesa oficial, a literatura e o gosto dominante.
O seu nome ficou indissoluvelmente ligado à editora & etc que, como editora independente de tudo e de todos, depois de preliminares não menores no jorrnalismo e na edição livreira fundou em 1973 e dirigiu até ao fim com o seu gosto pessoal, uma editora que marcou indelevelmente o mundo editorial em Portugal com obras trabalhadas uma a uma, peça a peça, a partir da capa, em edição única.
Sem ele e o & etc a literatura publicada em português (original ou tradução), prosa e poesia misturadas, não teria sido aquilo que foi até às suas margens mais extremas, também as mais vivas e esclarecedoras. A sua história está contada pelos participantes, incluindo o próprio Viítor, em "& etc - Uma Editora no Subterrâneo" (Lisboa: Letra Livre, 2013).
Personalidade maior, embora discreta, da cultura portuguesa dos últimos 50 anos, indispensável para que os mais conhecidos tivessem onde publicar o que queriam em qualquer altura, os menos conhecidos fossem acolhidos e permanecessem (enquanto ele quisesse) e os melhores estrangeiros menos ortodoxos tivessem lugar, o Vítor Silva Tavares permanece e perdura na sua cultura invulgar, integridade pessoal, honestidade intelectual, sentido do risco e da provocação mas também do humor - esgotando o meu vocabulário num crivo pessoal em que muito poucos outros como ele (se algum) passam.
Deixou organizada a edição em 5 (cinco) volumes da "Obra Escrita" de João César Monteiro, que coordenou e introduziu em Intróito Inaugural ao Volume I (Lisboa: Letra Livre, 2014) - e na & etc tinham sido publicados antes, e em vida dele, três livros do João César. Por ele e por causa dele a cultura portuguesa não é só uma história de gente bem comportada e politicamente correcta, de mesuras e "melhores cumprimentos" em conivência cúmplice. Honra lhe seja prestada por causa disso na hora da sua morte, em que Lisboa entristece. E que o seu exemplo continue a frutificar.
(Torna-se para mim ainda mais agreste conviver com os vivos depois da partida de mais este. Vocês só percebem isto se compreenderem que houve um tempo do & etc, o do Herberto, como houve um tempo do Orpheu, o do Pessoa. Funesto e luminoso centenário.)
(Torna-se para mim ainda mais agreste conviver com os vivos depois da partida de mais este. Vocês só percebem isto se compreenderem que houve um tempo do & etc, o do Herberto, como houve um tempo do Orpheu, o do Pessoa. Funesto e luminoso centenário.)
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