“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Das trevas para a luz

   O filme "Quarto"/"Room", de Lenny Abrahamson  (2015), baseado na novela de Emma Donoghue (publicada em Portugal pela Porto Editora), ela própria responsável pelo argumento, impressiona pela concentração espacial de mãe/Brie Larson e filho Jack/Jacob Trambley, que acompanhamos em planos aproximados (grandes e muito grandes planos) durante a primeira parte, que decorre na clausura do quarto a que estão contra sua vontade confinados quando ele faz cinco anos. Essa primeira parte termina com a fuga do filho preparada pela mãe. 
                    
    A partir da libertação de ambos, em vez de se diluir o drama aumenta pela estranheza com que se deparam ambos e que eles próprios estranham. O reencontro com a família é problemático por causa do avô, Robert/William H. Macy, enquanto que a comunicação social - leia-se, a televisão - submete a mãe a uma dura prova. Nesta segunda parte, passada já fora da clausura, no mundo real, muito justamente o contexto espacial é dado em termos mais largos.
    No final, com regresso de mãe e filho ao espaço em que viveram cativos regressam os planos muito próximos. Se "Quarto" contém uma ineludível carga metafórica e simbólica, é ao manter-se próximo de um realismo humano, que leva por exemplo a mãe a dizer que o filho é só dela, que ele se impõe e marca um espaço de interesse e curiosidade humana.                   
                    
    Com relevo para mãe e filho, os actores suportam tudo em especial no grande e muito grande plano, o que impõe o filme pelos melhores motivos. Em reacção, as instituições, nomeadamente hospitalar e médica, cumprem a sua função friamente, alheias ao que arde e queima naquela situação e naquele espaço familiar depois de o pior ter acabado. De mãos dadas, mãe e filho têm de traçar o seu próprio caminho de regresso, para ele de acesso à liberdade. Do dente dela ao cabelo dele tudo se tornou físico entre eles, por isso tanto mais forte.
     Tudo é muito difícil e ao mesmo tempo muito facilmente compreensível. Gostei da fotografia de Danny Cohen, não gostei da utilização da música de Stephen Rennicks. Não perceberei porque quem aprecia os filmes de Carl Th. Dreyer por causa do seu uso do grande-plano não aprecie este filme pelo menos pelo mesmo motivo.

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