“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Abuso consentido


   "Abus de faiblesse" é o mais recente filme da francesa Catherine Breillat (2013), um filme estranho e provocador marcado por mais uma grande interpretação de Isabelle Huppert como Maud Schainberg, uma realizadora de cinema que, depois de ter tido uma hemorragia cerebral, prepara um filme.    
    A actriz tem um trabalho excelente e muito difícil, porque a sua personagem fica com partes do corpo afectadas, a perna e a mão do lado esquerdo, o que a força a um acentuado claudicar e a uma posição estranha do braço e da mão.
                    
     Maud fica presa a um homem, um escroque que viu na televisão, Viko Piran/Kool Shen (um novo actor francês prometedor), e quer fazer dele o actor do seu novo filme. Com esse pretexto passam a encontrar-se com frequência e ele vai, a pouco e pouco, estorquir-lhe avultadas somas de dinheiro. No que ela consente passando-lhe cheques sucessivos.
    Na estranha relação que entre eles se estabelece os contactos de ambos são feitos por repetido recurso ao telemóvel, com ela frequentemente deitada, mas também na rua e em casa dela, e depois de ela ter tido novos ataques ele acaba por ir dormir a casa dela. Até a um início de reembolso da sua dívida.
                   
    Há amigos e familiares de Maud que a alertam para a gravidade da situação, mas ela a ninguém dá ouvidos. Até que arranja uma pistola que não usa e acaba por, confrontada com a avultada soma entregue sem explicações, explicar o que acontecera dizendo que, ao fazê-lo, era ela e não era ela.
     O primeiro-plano final de Maud é espantosamente utilizado por Isabelle Huppert para dizer tudo por palavras e exprimir tudo com o rosto.
                   
    A realização de Catherine Breillet é segura e muito boa, com excelente aproveitamento dos espaços, composição dos planos e uso das cores e das formas. Ela é também autora do argumento que se baseia na sua experiência de um avc (ela própria se cruza com Maud no hospital, logo no início) e em factos reais Até eu, que não sou um incondicional da cineasta, apreciei.

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