O mais recente filme de Pedro Almodóvar, "Julieta" (2016), assinala o seu regresso a um nível mais de acordo com a sua justa fama de grande cineasta. O grande trunfo deste filme é a sua construção em flash-back da protagonista ao escrever uma carta para a sua filha em que lhe conta a sua própria história, pois essa revela ser a melhor construção, a mais apropriada à sua estrutura narrativa e fílmica.
É dessa maneira que o passado de Julieta, marcado por tragédias masculinas dos homens que a marcaram, surge como relevante para ela e para quem o não conhece. Por definição os mortos não falam, e por isso ela escreve o que viveu, a que assistimos a partir da recordação dela - interpretada por Adriana Ugarte quando jovem, por Emma Suárez na actualidade - com Marian/Rossy de Palma e Ava/Inma Cuesta como testemunhas mais próximas de acontecimentos decisivos, enquanto Lorenzo/Dario Grandinetti, o seu homem tardio, viaja até Portugal.
Com argumento do cineasta a partir de contos de Alice Munro, "Julieta" traça um retrato de mulher pungente e poderoso, ao nível dos melhores melodramas de Almodóvar centrados em mulheres, construído com recurso a planos frequentemente próximos, com a consequente concentração nas personagens e em certos objectos ou elementos cenográficos específicos. E quando, depois de escrita a carta, o filme regressa ao presente é para a protagonista ser atropelada antes de saber pela filha, através de uma carta, da morte do seu neto mais velho.
A profissão de Julieta como professora de literatura clássica está bem vista, embora o reforço da tragédia que traz ao filme não fosse rigorosamente indispensável - ele tem por si as alusões à tragédia mas não tem nem quer ter o tom de epopeia, embora a refira. Mas aqui a tragédia masculina é também feminina, como no cinema de Almodóvar geralmente acontece. E reunir quatro gerações de uma mesma família está por si mesmo conseguido, num filme elíptico a partir da escrita.
Saúdo aqui o regresso quase em surdina ao seu melhor de um cineasta que já foi considerado o herdeiro de Luis Buñuel, o que nos seus últimos filmes estava muito atenuado, um regresso sem o espalhafato formal e narrativo que para muitos constituiu a sua imagem de marca mas também a sua maneira, agora estilisticamente depurada.
A profissão de Julieta como professora de literatura clássica está bem vista, embora o reforço da tragédia que traz ao filme não fosse rigorosamente indispensável - ele tem por si as alusões à tragédia mas não tem nem quer ter o tom de epopeia, embora a refira. Mas aqui a tragédia masculina é também feminina, como no cinema de Almodóvar geralmente acontece. E reunir quatro gerações de uma mesma família está por si mesmo conseguido, num filme elíptico a partir da escrita.
Saúdo aqui o regresso quase em surdina ao seu melhor de um cineasta que já foi considerado o herdeiro de Luis Buñuel, o que nos seus últimos filmes estava muito atenuado, um regresso sem o espalhafato formal e narrativo que para muitos constituiu a sua imagem de marca mas também a sua maneira, agora estilisticamente depurada.
História de mulheres como melodrama com destino trágico delas e deles, "Julieta" retoma uma inspiração que, nos filmes do cineasta, deu sempre os melhores resultados - em "Mulheres
à Beira de um Ataque de Nervos"/"Mujeres al borde de un ataque de
nervios" (1986), "A Flor do Meu Segredo"/"La flor de
mi secreto" (1995), "Em Carne Viva"/"Carne trémula" (1997), "Tudo Sobre a Minha Mãe"/"Todo sobre mi madre" (1999) e mesmo "Fala com Ela"/"Habla con ella" (2002). Sobre Pedro Almodóvar ver "Decorativo", de 21 de Outubro de 2012, e "Em queda", de 12 de Maio de 2013.
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