"O Astrágalo"/"L'astragale" é a segunda longa-metragem da acriz Brigitte Sy (2014), baseada no livro homónimo de Albertine Sarrazin (1937-1967), com adaptação e diálogos seus e de Serge Le Péron. Vi-o agora, entendi (não é difícil) e gostei. Aliás, o livro autobiográfico tinha já sido adaptado ao cinema por Guy Casaril em 1968.
Não tem, aliás, nada de difícil de perceber para quem conhecer os primeiros filmes de Jean-Luc Godard, nomeadamente "Viver a Sua Vida"/"Vivre sa vie" (1962), a que faz alusão expressa na figura da protagonista, Albertine/Leila Bekhti, que parte um osso do pé ao fugir da prisão e é ajudada por Julien/Reda Kateb, por quem se apaixona. É um filme garreliano, com os seus filhos Esther como Marie e Louis Garrel como fotógrafo parisiense e a própria realizadora, a mãe deles, como Rita (sobre Philippe Garrel, ver "Sair depressa", de 4 de Agosto de 2014, e "Sair devagar", de 4 de Abril de 2016).
Albertine prostitui-se e vai à igreja onde Nana/Anna Karina se prostituía e ia ao cinema ver um filme sobre a paixão e morte de uma santa, e está bem vista uma coisa pela outra. O final cita expressamente o final do mesmo filme de Godard, como este fazia no seu início com o cinema americano dos anos 50, que "O Astrágalo" cita também - por exemplo aqueles passos sonoros de mulher. O preto e branco da fotografia de Frédéric Serve é igualmente alusivo e está muito bem utilizado.
Passado nos anos 50, é um excelente filme lírico, elíptico e evocativo, por vezes quase bressoniano. O meio marginal está muito bem construído e são especialmente boas as personagens femininas, em primeiro lugar a protagonista: os seus sentimentos são sentimentos comuns, a sua vida uma vida comum, aquela que lhe coube viver. Leila Bekhti está muito bem, morena e loura.
Respeitar e convocar a memória é um propósito inteiramennte conseguido neste "O Astrágalo", em que são evocadas e invocadas a memória da vida e a memória do cinema no que têm de melhor, o que fica muito bem a Brigitte Sy. Agora tenho de ver o filme do Louis, "Os Dois Amigos"/"Les deux amis" (2015), que ainda não vi.
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