À sua terceira longa-metragem, "A Promessa"/"The Pledge" (2001), o conhecido actor Sean Penn dirige um excelente e original filme, para o qual se baseia na obra de Friedrich Dürrenmatt. Sem poder estabelecer um confronto pertinente com os filmes anteriores por ele dirigidos, "União de Sangue"/"The Indian Runner" (1991) e "Acerto Final"/"The Crossing Guard" (1995), uma vez que só conheço o segundo, posso no entanto dizer desde já que este "A Promessa" é uma boa surpresa pela forma como o actor enquanto realizador agarra na estrutura narrativa e procede à sua transposição pessoal em termos fílmicos.
Jerry
Black, o detective apanhado pela situação de reforma que Jack Nicholson
interpreta com a sua imensa sabedoria e a sua espantosa intuição do cinema,
assume como última incumbência, para lá da sua situação de activo, a de
descobrir o assassino de crianças que espalha o terror a partir da descoberta
do cadáver de uma primeira menina. O trabalho de Jack Nicholson é notável ao
transmitir-nos a dualidade da personagem, dividida entre toda uma vida
profissional activa e uma situação de inactividade que a espera, não obstante a
qual se compromete a descobrir o assassino. Mas se esse lado é
muito evidente no filme, em si mesmo este deve-se ao talento de Sean Penn como realizador, que é responsável por um trabalho fílmico rigoroso e denso, que se baseia no
tratamento dos elementos visuais do filme e na caracterização de todas as
personagens de forma precisa e muito acertada, para o que conta com excelentes
actores no seu melhor: para além de Jack Nicholson, Benício Del Toro numa
composição notável, Aaron Eckart, Helen Mirren e, em especial, Vanessa
Redgrave, Sam Shepard e Colin Right Penn, esta no papel de Lori, com quem Jerry
se refugia na montanha juntamente com a filha dela, Chrissy/Pauline Roberts, além de Harry Dean
Stanton e Mickey Rourke.
O
avanço gradual da narrativa está muito bem dado em termos fílmicos, o que faz
com que "A Promessa" vá tomando conta, a pouco e
pouco mas irresistivelmente, dos espectadores, presos que ficam pela repelência dos crimes que
estão em causa e pelo papel positivo que relativamente a eles Jerry Black se
propõe desempenhar, se compromete a desempenhar. Para a criação do ambiente
fílmico contribuem também, e decisivamente, a fotografia, sempre notável, de
Chris Menges e a música de Hans Zimmer, bem como, e inevitavelmente, os
argumentistas Jerzy Kromolowski e Mary Olson-Kromolowski.
À
medida que se desenvolve a narrativa e se aprofunda a personagem do detective,
nomeadamente através da sua relação com Lori, vão aumentando os elementos de
interesse mas também os riscos que Jerry Black se dispõe a correr. E é então que
o clima dramático se adensa, que cresce a angústia do espectador, preparado
para um final espectacular, à maneira daquilo a que está habituado no cinema de
Hollywood. Ora acontece que Sean Penn corta as pontes com a narrativa
tradicional do filme sobre um "serial killer", que este seu filme aparenta ser,
para se centrar na complexidade sem saída do investigador, que nos deixa
estarrecidos no plongé final.
Jogando
na maior ambiguidade, tanto maior quanto a pureza de intenções do detective se
apresenta sem sombra de dúvidas até pelo que nos é mostrado da sua evolução
pessoal, o que é facilitado pela própria novela adoptada como ponto de
partida, "A Promessa" de Sean Penn surge como uma agradável e estimulante surpresa no meio do mundo de clichés em que tantas vezes o cinema
americano se move, tanto mais admirável quanto revela pleno domínio dos
meios cinematográficos e dos mecanismos da relação que se estabelece entre o
filme e os espectadores. Original e seguro, Sean Penn mostra com este filme
que pode perfeitamente ombrear, como cineasta, com a sua qualidade de um dos melhores actores americanos da actualidade.
Dezembro 2006
Dezembro 2006
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