“Um não sei quê, que nasce não sei onde,/Vem não sei como, e dói não sei porquê.” Luís de Camões

"Na dor lida sentem bem,/Não as duas que êle teve,/Mas só a que êles não têm." Fernando Pessoa

"Lividos astros,/Soidões lacustres.../Lemes e mastros.../E os alabastros/Dos balaustres!" Camilo Pessanha

"E eu estou feliz ainda./Mas faz-se tarde/e sei que é tempo de continuar." Helder Macedo

"Conchas, pedrinhas, pedacinhos de ossos..." Camilo Pessanha

“Vem, vagamente,/Vem, levemente,/Vem sozinha, solene, com as mãos caídas/Ao teu lado, vem” Álvaro de Campos

"Chove nela graça tanta/que dá graça à fermosura;/vai fermosa, e não segura." Luís de Camões

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Bichos estranhos

    "Ma Loute", o mais recente filme de Bruno Dumont (2016), prossegue a inspiração do anterior "O Pequeno Quinquin"/"P'tit Quinquin" (2014) de uma distorção que esclarece a narrativa, agora situada no início do Século XX na Costa do Canal, em Slack Bay, e as suas personagens, ricos aristocratas e pobretanas que trabalham.
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    Dois polícias, Alfred Machin/Didier Després e Malfoy/Cyril Rigaud, encarregados de investigar desaparecimentos, acham os ricos bichos estranhos mesmo sem saberem quão estranhas são as suas relações familiares - de André Van Peteghem/Fabrice Luchini e Aude Van Peteghem/Juliette Binoche, os dois irmãos, Isabelle Van Petteghem/Valeria Bruni Tedeschi, a mulher do primeiro, e Christian Van Petteghem/Jean-Luc Vincent, um primo - e concentrando-se neles o cineasta traça um retrato de época conseguido em distorção, exagero expressivo que atinge a desfiguração. 
    Do outro lado, contudo, as sugestões são não menos estranhas, com o Eterno Brufort/Thierry Lavieville e a Mãe Brufort/Caroline Carbonnier, com Nadège/Laura Dupré como criada dos primeiros, por isso em circulação entre os dois mundos e deslocada.
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    Com a paixão cruzada de Ma Loute Brufort/Brandon Lavieville e Billie Van Peteghem/Raph são os dois mundos que se cruzam para se virem a descruzar outra vez, mas este "Ma Loute" é sobretudo um filme pictórico, visualmente impressionista na magnífica fotografia de Guillaume Deffontaines, que colabora com o cineasta desde "Camille Claudel 1915" (2013).
    No novo rumo que imprimiu à sua obra, em que o satírico se alia ao poético, com este filme em que Isabelle levita, há na praia um carro à vela e Machin incha como um balão, de que é argumentista, autor dos diálogos e realizador, Bruno Dumont continua a destacar-se no panorama do cinema francês e europeu pela sua originalidade e inteligência - sobre o cineasta ver  "A dignidade do cinema", de 30 de Julho de 2012, "Filme de programa", de 30 de Junho de 2013 e "Pedra de toque", de 15 de Fevereiro de 2015.

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