Em "Paterson" (2016) o americano Jim Jarmusch regressa às suas origens para filmar sem estrelas e sem rede uma vida humilde, a de um motorista de autocarro chamado Paterson - título de um poema longo célebre de William Carlos Williams (1883-1963), poeta maior do modernismo americano, editado em português pela Relógio d'Água (1998) - em Paterson, New Jersey.
Com Adam Driver como Paterson e Golshifteh Farahani com Laura, a mulher dele, sobre argumento seu o autor mais importante do novo cinema independente americano cria um filme de quotidiano laborioso de um americano que tem a característica especial de escrever poesia. Aí entra a poesia de Ron Padgett, poeta amigo de Jarmusch, com um poema final do próprio Williams, "This Is Just to Say". E a presença das palavras dos poemas que são escritos na imagem e no som confere plena visibilidade ao acto de as escrever, assim visível e auditivamente poético, tanto mais quanto Paterson não usa computador, telemóvel ou o mais e escreve à mão.
Acompanhando os rituais diários do protagonista, o filme segue-o entre casa e o trabalho, deste para o bar e de regresso a casa onde o esperam Laura e Marvin, o cão, durante uma semana, de segunda-feira a domingo, para regressar a uma/a mesma segunda-feira. Com pormenores deliciosos, como as conversas dos passageiros do autocarro e de Paterson com o encarregado, as conversas do bar (fantástica a noite do xadrês e da mesa de bilhar), o diálogo dos anarquistas, as conversas do casal em casa a que o outro casal, Everett/William Jackson Harper e Marie/Chasten Harmon, faz contraponto no bar.
Jarmusch tem a ciência certa de onde colocar a câmara, como dirigir os actores, onde fazer entrar a música dos SQÜRL, a sua própria banda, composta e interpretada por si próprio e Carter Logan, e Paterson é uma maravilhosa pequena cidade americana, imaginada desta maneira pelo cineasta, onde se recorda Bud Abbott e Lou Costello e até existe um centro comercial que passa filmes de terror antigos, a preto e branco, que o casal vai ver.
"Paterson" é, assim, um filme fantástico, poético, de humor subtil que esconde os grandes dramas familiares e amorosos. Reconduzidos ao início depois de Marvin ter destruído o caderno do protagonista e um misterioso japonês lhe ter oferecido um caderno em branco, o filme fecha de forma perfeita, circular.
Por sua vez "Gimme Danger" (2016), escrito e dirigido pelo mesmo Jim Jarmusch, é um documentário que celebra os The Stooges, banda rock dirigida por Iggy Pop, com origem nos anos 60 do Século XX e cuja história é evocada pelos sobreviventes respectivos.
Com imagens de arquivo da banda e o comentário de Iggy que esclarece cada circunstância, mas também com recurso imaginativo à animação, da responsabilidade de James Kerr, e a imagens dos filmes e programas televisivos antigos mais banais, sem se questionar nem questionar os músicos de um grupo que ele especialmente aprecia é também um pouco a história da América, com especial atenção aos anos 60 e 70, que o cineasta aqui recorda.
No final contam-se quatro mortos de The Stoorges originais e adquiridos, mas é a loucura jubilatória dos seus concertos que marca este filme, com o comentário sempre pertinente e esclarecedor de Iggy, de quem é adoptado o ponto de vista, sobre cada situação evocada, de tal maneira que mesmo quem não apreciar o rock fica cativado, siderado com imagens e sons.
Enquanto em "Paterson" temos a cores a pura arte do cineasta, em "Gimme Danger" temos a preto e branco e a cores a arte impura da música e do cinema. Em comum os dois filmes têm, além do realizador, Affonso Gonçalves na montagem - sobre Jim Jarmusch, um dos melhores cineastas contemporâneos, ver "Um cineasta de culto", de 16 de Junho de 2014.
"Paterson" é, assim, um filme fantástico, poético, de humor subtil que esconde os grandes dramas familiares e amorosos. Reconduzidos ao início depois de Marvin ter destruído o caderno do protagonista e um misterioso japonês lhe ter oferecido um caderno em branco, o filme fecha de forma perfeita, circular.
Por sua vez "Gimme Danger" (2016), escrito e dirigido pelo mesmo Jim Jarmusch, é um documentário que celebra os The Stooges, banda rock dirigida por Iggy Pop, com origem nos anos 60 do Século XX e cuja história é evocada pelos sobreviventes respectivos.
Com imagens de arquivo da banda e o comentário de Iggy que esclarece cada circunstância, mas também com recurso imaginativo à animação, da responsabilidade de James Kerr, e a imagens dos filmes e programas televisivos antigos mais banais, sem se questionar nem questionar os músicos de um grupo que ele especialmente aprecia é também um pouco a história da América, com especial atenção aos anos 60 e 70, que o cineasta aqui recorda.
No final contam-se quatro mortos de The Stoorges originais e adquiridos, mas é a loucura jubilatória dos seus concertos que marca este filme, com o comentário sempre pertinente e esclarecedor de Iggy, de quem é adoptado o ponto de vista, sobre cada situação evocada, de tal maneira que mesmo quem não apreciar o rock fica cativado, siderado com imagens e sons.
Enquanto em "Paterson" temos a cores a pura arte do cineasta, em "Gimme Danger" temos a preto e branco e a cores a arte impura da música e do cinema. Em comum os dois filmes têm, além do realizador, Affonso Gonçalves na montagem - sobre Jim Jarmusch, um dos melhores cineastas contemporâneos, ver "Um cineasta de culto", de 16 de Junho de 2014.
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